sábado, 31 de dezembro de 2016

Fausto, de Johann W. Goethe

"Fausto" de Johann W. Goethe
Relógio D' Água, 2013
470 Páginas

Agradável surpresa antes de tudo, o "Fausto" de Johann Wolfgang von Goethe não é propriamente um livro de leitura fácil. Não é prosa, é poesia e também não é poesia poesia. É uma tragédia. Num certo sentido, e para que se possa perceber o estilo, parece que estamos diante de uma espécie de "Os Lusíadas" de Camões.

A obra está dividida em duas partes, sendo que a segunda é composta por cinco actos. Destas duas partes, gostei muito mais de ler a primeira do que a segunda, quando Fausto decide vender a alma ao diabo e, cansado de levar uma vida de estudo longe dos prazeres da vida, decide envolver-se com Margarida, uma jovem inocente e ingénua. A segunda parte tem, a meu ver, muitas personagens (talvez demasiadas) e isso fez-me perder um pouco na história, deixando-me, por vezes, algo confusa. 

Consta que o Doutor Fausto foi um homem que viveu na Alemanha entre 1480 e 1540, mas esta informação é apenas uma das várias que existem acerca deste homem. Algumas são até conflituantes entre si. É, ao que parece, através de Goethe que a figura de Fausto se torna mais conhecida. A obra demorou quase sessenta anos a ser escrita, sendo que Goethe escreveu primeiro a primeira parte e alguns anos depois a segunda.

Gostei. Goethe, figura impar do Romantismo europeu, demonstra que se adapta bem a vários estilos literários, escrevendo com talento e mestria. E é fácil perceber porque é que "Fausto" é considerada a sua obra prima. "Fausto" reune em si como que um pedaço de cada uma das suas outras obras, como "Werther", "Viagem a Itália" e "O Jogo das Nuvens", só para dar alguns exemplos. Há algo comum entre estas quatro obras que vai muito para além do facto de terem sido escritas todas pela mesma pessoa... !

*
"A vergonha quando nasce vem/Ao Mundo no meio de segredos, / E o véu da noite lhe põem/ A cobrir cabeça e ouvidos;/ Bem gostaríamos de a matar, /Mas quando cresce e fica grande, /Nada impede que à luz do Sol ande, /Sem, porém, mais bela ficar./ Quanto mais é feia e impura, /Mais a claridade procura." (p.174)

https://www.goodreads.com/review/show/1853704366

quarta-feira, 28 de dezembro de 2016

A Descoberta Alfa Ómega, de Mark Victor Hansen & Bill Froehlich


"A Descoberta Alfa Ómega" de Mark Victor Hansen & Bill Froehlich
Estrela Polar, 2011
295 Páginas


Este livro não me seduziu à primeira. Depois, achei que lhe devia dar uma oportunidade. Trouxe-o para casa e ficou praticamente um ano na estante à espera que eu voltasse a pegar nele. Nunca senti verdadeiramente aquele impulso que sente quando queremos muito ler algo, quase como um desejo de possuir (sim, estou mesmo a falar de possuir nesse sentido) esse mesmo livro.

Agora, no fim do ano, achei, ainda que não muito convicta, que tinha chegado a hora de voltar a pegar nele e lê-lo de uma vez por todas. Sentei-me, comecei a ler as primeiras páginas e senti que o acto de ler me estava a causar um enorme desconforto, uma espécie de stress. Julguei que tal se pudesse atribuir à enorme dor de cabeça que senti nesse dia, mas não. Porque no dia a seguir retomei a leitura e voltei a sentir o mesmo. E de todas as vezes que peguei no livro para o ler, senti sempre o mesmo. Este livro não é mesmo para mim. 

Por outro lado, acho que a ideia dos autores de apresentar uma fábula e misturar com principios de auto-ajuda, apesar de ser extremamente interessante,  não funcionou bem. Não está bem conseguida no meu entender. O livro acaba por ser uma mixórdia. Nem é peixe, nem é carne. Nem estou diante de uma história, nem diante de um livro espiritual/de auto-ajuda. É meio caótico. Vai buscar exemplos que não lembram a ninguém e mistura-os com outros completamente normais do dia-a-dia. Recorre também à inclusão de personagens meio bizarras, que eu nem sei bem de onde vieram, nem consegui perceber bem a justificação de ali aparecerem e qual a sua motivação.

Tomei, contudo, nota de uma série de frases que achei dignas de guardar, porque é efectivamente importante tê-las em mente no correr dos dias. Para não esmorecer perante as várias montanhas, ingremes e de dificil acesso, que parecem suceder umas às outras na vida... 

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"-Acreditar não é só desejar que alguma coisa aconteça, (...) - Acreditar é acção. " [p.62]

https://www.goodreads.com/review/show/1852137779

segunda-feira, 26 de dezembro de 2016

Às 9 no Meu Livro, de Sofia Castro Fernandes


"Às 9 no Meu Livro" de Sofia Castro Fernandes
Marcador, 2016
186 Páginas



"Às 9 no meu livro" é um livro que segue a mesma linha do blogue de Sofia Castro Fernandes, "Às 9 no meu blog" (http://www.asnovenomeublog.com/), blogue que sigo praticamente desde o início e que recomendo: optimismo, muito optimismo, mesmo que perante as maiores adversidades. 

Não o consegui ler aos poucos... Estilo uma mensagem cada dia (como acho que será mais proveitoso, porque dá para saborear melhor)! Mas isso não me impediu naturalmente de ler uma mensagem de cada vez, tomando-lhe a essência. Quando é para ler, é para ler, é para sorver as palavras com alguma sofreguidão, se houver necessidade disso. E eu estava com sede, sede de optimismo. Portanto, nada melhor, ainda para mais numa altura de balanço própria do fim do ano, do que agarrar num livro destes para ler...!

Os textos são curtos. Meia página, duas meias páginas no máximo. Simples e directos. Bem escritos. E plenos de optimismo, incentivos à resiliência, ao gosto pelas coisas simples e pequenas da Vida e ao cultivo do agradecimento. 

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"E mesmo que, ao longo do caminho, tropeces umas quantas vezes, e vais tropeçar, e vais cair, é na queda que percebes a consistência da tua força, os limites da tua resistência, os batimentos do teu coração, a capacidade de aceitar, agradecer, perdoar, e aquela doçura que conquistas quando deixas que a vida te surpreenda. 
É preciso estar atento para agarrar a oportunidade, sentir o clique, recuar para tomar balanço. E dar o salto." [p.22].

https://www.goodreads.com/review/show/1847562797

Caminhar no Gelo, de Werner Herzog


"Caminhar no Gelo" de Werner Herzog
Tinta-da-China, 2011
124 Páginas

Werner Herzog decide fazer uma caminhada, entre o final de Novembro e o início de Dezembro de 1974 (demorou três semanas), de Munique a Paris, quando fica a saber que a sua mentora no mundo do cinema, Lotte Eisner (alemã que viveu o período do Terceiro Reich e que por ser judia teve de fugir para França), se encontra muito doente e, muito provavelmente, à beira da morte. 

Pelo caminho, Herzog vai dormindo aqui e ali, onde calha, descrevendo sem se perder em detalhes excessivos o que vai vendo, ao mesmo tempo que num momento ou noutro vai tomando mais sentido à solidão que o acompanha. 

Gostei do que li, mas fiquei a achar que a caminhada para "prolongar" a vida de Eisner foi apenas um pretexto para o autor (com um valente espirito aventureiro) fazer esta viagem em pleno Inverno e, mais tarde, escrever este livro. Até porque ele só fala de Eisner no início e praticamente no fim...!

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"À volta das árvores, no chão enlameado, estão caídas maçãs podres que ninguém apanhou. Misteriosamente, uma das árvores, que de longe parecia ser a única com folhas ainda estava carregada de maçãs. Apanhei uma, era bastante amarga, mas boa para a sede. Atirei o caroço contra a árvore e as maçãs caíram como chuva. Quando pararam de rolar, transmitindo uma imagem de sossego assim caídas, pensei para mim: ninguém pode imaginar esta ausência total de pessoas. Este é o dia mais desolado, mais solitário de todos os dias. Aproximei-me então e sacudi a árvore até ela ficar nua. As maçãs caíram ao chão, engolidas pelo silêncio. Quando tudo chegou ao fim, abateu-se sobre mim um silêncio imenso, e olhei à volta, e não havia ninguém. Ali estava eu sozinho."
[p.91]

https://www.goodreads.com/review/show/1847562325?book_show_action=false&from_review_page=1

sexta-feira, 23 de dezembro de 2016

O Processo, de Franz Kafka


"O Processo" de Franz Kafka
Relógio D'Água, 2015
293 Páginas

Publicado já depois da morte de Franz Kafka, "O Processo" é uma obra que não ficou completa. No entanto, a ideia que o autor pretende passar percebe-se bem, muito bem, sem qualquer margem para dúvidas. A sua escrita é clara.

A obra versa sobre a culpa (ser culpado a todo o custo, ser culpado sem conhecer o motivo, ser culpado porque se tentou defender ou até porque se envolveu com que não devia), a justiça (que aqui parece um mito, algo impossível e inatingivel, porque os advogados de defesa não têm ordem de assistir à sessão em que o seu cliente é acusado, nem ter sequer acesso aos documentos relacionados com o processo) e os tribunais  (que abrem a um Domingo e que dividem a sala onde a sessão se verifica com um casal de trabalhadores do tribunal, só para dar alguns exemplos). E continua a estar actual porque o bom desfecho do processo depende em muito dos bons contactos que se tem...! 

Nesta edição, e já depois de se conhecer o "fim", encontram-se vários capítulos fragmentados, que o autor, tendo morrido jovem e com tuberculose (deixou de se conseguir alimentar), deixou por terminar e que, ainda assim, não impedem, como já referi anteriormente, que se compreenda a ideia que este queria transmitir sobre o mundo das leis e a sociedade da época (?). 

Gostei muito e recomendo! Tinha lido "A Metamorfose" e, apesar de não ter desgostado, não fiquei muito fã. É um livro que nos comprime, que nos esmaga e, em certa medida, triste. "O Processo" é diferente, pois mantendo o estilo kafkiano de descrição da realidade por via da expressão de sentimentos e emoções, é uma obra soberba e faz-nos pensar no quão subjectiva pode ser a justiça!

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"Ora, decerto que K. já se havia apercebido por esta altura, e por experiência própria, de que os funcionários subalternos da grande organização que era aquele tribunal não eram propriamente irrepreensíveis, mas sim incumpridores e até corruptos, pelo que se abriam, por assim dizer, brechas no sistema judicial, por natureza, rigoroso e hermético." (p. 114)

https://www.goodreads.com/review/show/1837130526

Eu e os Políticos, de José António Saraiva

"Eu e os Políticos" de José António Saraiva
Gradiva, 2016
263 Páginas


José António Saraiva serve-se da sua experiência enquanto Director do Expresso e depois do Sol, para nos contar, de memória e/ou recorrendo a anotações tomadas no seu diário, aquilo que pensa sobre muitos dos políticos portugueses de agora, como resultado das conversas privadas que manteve directamente com estes ou através de terceiros (que os conheciam de perto) com eles. Há um caso ou outro de uma figura que não é política, mas que ainda assim acaba por ter relação com esta, como foi, por exemplo, o caso de Margarida Marante, um dos textos que mais gostei de ler aqui. 

No fundo o que o autor faz é colocar preto no branco o que pensa sobre cerca de 40 figuras relacionadas com a política portuguesa. O resultado é interessante, sobretudo para quem quiser compreender um pouco melhor como funciona na realidade este país. Além do que, curiosamente, reforcei a ideia que tinha de muitos deles e noutros fiquei com uma ideia ligeiramente diferente (em alguns casos, admito que a ideia que tinha melhorou bastante). 

No meu entender, o livro não é verdadeiramente polémico. É natural que algumas pessoas possam ficar um pouco desconfortáveis, milindradas, mas essas pessoas também sabem que no meio em que se movem têm de ter cuidado com o que dizem e em quem confiam. O mundo da política está cheio de jogos de bastidores, de punhaladas. Há amigos a sério, mas também há amigos que dão jeito, de circunstância, que hoje servem e amanhã já não servem. Faz parte da natureza humana quando o que está em causa é a obtenção de mais poder. No fundo, é essa a grande ideia que se tira da leitura de "Eu e os políticos". 
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"Os políticos-comentadores são um pouco como os treinadores desempregados - que, para manterem a visibilidade, se tornam comentadores de futebol. E raramente assumem posições de ruptura. Porque podem voltar a ter emprego e não querem que os seus comentários lhes possam complicar a vida no futuro." (p.183).

https://www.goodreads.com/review/show/1836216827

sexta-feira, 16 de dezembro de 2016

[Apresentação] Geopolítica da Alemanha: Ratzel, Haushofer e as duas Guerras Mundiais do Século XX, de Marisa Fernandes

"Geopolítica da Alemanha: Ratzel, Haushofer e as duas Guerras Mundiais do Século XX" de Marisa Fernandes
Instituto Universitário Militar/ Fronteira do Caos Editores, 2016
164 Páginas

Lançado no passado dia 24 de Novembro, no Instituto Universitário Militar, este é o primeiro livro em que sou a única autora. E, por razões óbvias, as linhas que se seguem não fazem parte de uma crítica, como as que habitualmente costumo aqui escrever, mas antes de uma apresentação da obra "Geopolítica da Alemanha: Ratzel, Haushofer e as duas Guerras Mundiais do Século XX".

Antes de mais, e embora partindo da Dissertação de Mestrado em Ciência Política e Relações Internacionais, defendida em 2010 na Universidade Nova de Lisboa, este livro seguiu agora um rumo independente e adquiriu uma vida própria, tendo já muito pouco do texto original. O tema é o mesmo (as relações entre o Espaço e o Poder na Alemanha entre 1871 e 1945), é certo; o conteúdo, porém, foi completamente reformulado, reflectindo muito do trabalho que tenho vindo a desenvolver desde 2011 (até agora), quando ingressei no Doutoramento em Estudos Estratégicos na Universidade de Lisboa.

Com efeito, a obra associa a História, as Relações Internacionais, a Guerra, a Geopolítica, os Estudos Estratégicos e a Literatura, áreas que, além de me fascinarem, têm requerido muito da minha atenção e dedicação nos últimos anos. Por outro lado, procurei escrevê-lo de forma a poder ser lido por qualquer pessoa, com ou sem formação nestas áreas, sem com isso deixar de lado o rigor e o cuidado necessários e exigidos num trabalho destes.

No que respeita à sua organização, "Geopolítica da Alemanha: Ratzel, Haushofer e as duas Guerras Mundiais do Século XX" encontra-se dividido em cinco partes. Exceptuando a introdução, correspondente à primeira parte, e a conclusão, correspondente à quinta parte, o livro tem uma segunda parte intitulada "Em direcção à Geopolítica", uma terceira intitulada  "Friedrich Ratzel, a Alemanha de Wilhelm II e a Primeira Guerra Mundial" e uma quarta intitulada "Karl Haushofer, a Alemanha de Adolf Hitler e a Segunda Guerra Mundial", que é também a mais extensa porque é efectivamente depois da Primeira Grande Guerra que se pode falar da Geopolítica (só nascida nos anos vinte do século XX).

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Na segunda parte ("Em direcção à Geopolítica") abordo não só a complexidade inerente ao acto de definir a Geopolítica, como também apresento uma definição de Geopolítica (partindo da relação entre o Espaço e o Poder, essenciais para este saber, seguindo para o conhecimento do Espaço e depois para a disputa do Poder pelo Espaço, originando a Guerra).

Na terceira parte ("Friedrich Ratzel, a Alemanha de Wilhelm II e a Primeira Guerra Mundial"), começo por abordar a Kleindeutschland [pequena Alemanha] de Otto von Bismarck, uma opção de unificação da Alemanha que, colocando na liderança a Prússia, deixa de lado a Áustria-Hungria. Seguidamente, analiso o pensamento de Friedrich Ratzel e da sua Geografia Política na passagem da Alemanha de Otto von Bismarck para a de Wilhelm II, bem como a Weltpolitik [política mundial] de Wilhelm II, o último Imperador da Alemanha. É de referir que esta parte termina com a Primeira Guerra Mundial e a identificação das convergências e divergências existentes entre as perspectivas de Ratzel e de Wilhelm II para a Alemanha.

Na quarta parte ("Karl Haushofer, a Alemanha de Adolf Hitler e a Segunda Guerra Mundial"), começo por me referir à República de Weimar na Alemanha do Pós Primeira Guerra Mundial, abordando os momentos-chave que caracterizaram este período nas relações entre o Espaço e o Poder alemães, a começar pelo Tratado de Versailles, o Diktat.

Depois, debruço-me sobre o nascimento da Zeitschrift für Geopolitik [revista de Geopolítica] e, em seguida, sobre o pensamento de Karl Haushofer  e da sua Geopolítica para a Alemanha. Existe igualmente um capítulo sobre a emergência da Cartografia Sugestiva, antes de entrar na Alemanha de Adolf Hitler.

A partir de 1933, tudo muda: a Escola de Geopolítica passa a ser um instrumento de propaganda ao serviço do Nacional-Socialismo e a Cartografia Sugestiva também, sendo que cada uma destas é objecto de um capítulo próprio. Entretanto, inicia-se a expansão militar da Alemanha que trato no capítulo seguinte e a promoção do caminho para a Guerra, a eliminação e proibição do que o contraria, matéria de outro capítulo ainda.

Com a Segunda Guerra Mundial, os mapas tornaram-se um elemento de justificação da Guerra, como procuro demonstrar em capítulo próprio, sendo que no decorrer do conflito se verifica a extinção da Zeitschrift für Geopolitik (um capítulo) e o afastamento de Karl Haushofer e da familia (outro capítulo). Porque este se trata de um livro de Geopolítica o penúltimo capítulo desta parte é dedicado à concretização espacial (e não só) do Lebensraum [espaço vital] de Hitler. Termino, pois, na linha da lógica adoptada para a terceira parte, com a identificação de convergências e divergências entre as perspectivas de Karl Haushofer e de Adolf Hitler para a Alemanha na Segunda Guerra Mundial.

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Efectivamente, este estudo tem como objectivo "conferir maior clareza às relações entre o pensamento, acerca das relações entre o espaço e o poder, e a acção política alemãs, (...), visando uma maior aproximação à realidade da Alemanha do período entre as Grandes Guerras do século XX. Por outro lado, procura-se também contribuir para uma melhor compreensão do que é a Geopolítica, qual a sua importância, e em que contexto é que esta surgiu na Alemanha, almejando, deste modo, quebrar a mística e o tabu que parece estar associada à Geopolítica alemã na Primeira e na Segunda Guerras Mundiais" (p.4). 

Sem me querer alongar mais, sublinho que a "Geopolítica da Alemanha: Ratzel, Haushofer e as duas Guerras Mundiais do Século XX" se inicia com as seguintes palavras de Stefan Zweig, escritor austríaco de origem judia (que acabou por se suicidar durante a Segunda Guerra Mundial no Brasil), que, no meu entender, reflectem no essencial o que foram as relações entre o Espaço e o Poder da Alemanha entre 1871 e 1945:

“O sol brilhava em toda a sua força e plenitude. Ao regressar a casa, reparei de repente na minha própria sombra que me precedia, tal como via a sombra da guerra passada por trás da guerra presente. Durante todo este tempo, ela nunca mais saiu do meu lado, aquela sombra, pairando, dia e noite, sobre cada um dos meus pensamentos; talvez os seus escuros contornos apareçam também em alguma destas páginas. Mas, em última análise, cada sombra é também filha da luz, e só quem tenha vivido a claridade e a escuridão, a guerra e a paz, a ascensão e a queda, só esse terá verdadeiramente vivido”
(Stefan Zweig, 2014, pp.507-508).

Boas leituras!

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Para adquirir o livro:
O livro vai estar à venda no Instituto Universitário Militar - IUM (na Rua de Pedrouços, 1449-027 Lisboa) e há duas formas de o obterem:
1) telefonando, antes de lá irem,para os serviços financeiros (213 002 174) e dizendo que querem ir lá buscar um exemplar (o preço é de 15 euros);
2) ou enviando um e-mail para o sr. Comandante Santos Madureira (madureira.cas@ium.pt), solicitando o envio de um exemplar para a vossa morada. Esse envio será feito à cobrança (no valor de 15 euros + portes).

Se tiverem alguma dúvida ou dificuldade, sintam-se à vontade para me enviar uma mensagem pessoal para marisaasfernandes@gmail.com

quarta-feira, 14 de dezembro de 2016

Na Vida com Garra, de Telma Monteiro

"Na Vida com Garra" de Telma Monteiro
Manuscrito, 2016
261 Páginas


A judoca de alta competição, de reconhecido mérito, esforço e dedicação (a quantidade de medalhas fala por si mesmo), que ganhou uma medalha de Bronze nos últimos Jogos Olimpicos, de 2016, no Rio de Janeiro, desafia cada um de nós a superar-se, a ser cada vez melhor e a realizar-se... Com garra! E garra parece não lhe faltar, dando para perceber ao longo de toda a obra que é uma mulher "de fibra", daquelas que, por mais obstáculos que encontre no caminho, jamais desiste. Porque desistir é desistir de si própria, como ela mesma refere. 

Contando a sua experiência de vida até entrar no Judo e depois enquanto judoca, Telma Monteiro procura retirar do Judo (do tatami - tapete) os ensinamentos necessários à nossa vida diária: à superação das dificuldades e à realização dos sonhos. Diria até que a autora nos apresenta um guia de alguém que passou e tem passado por muito até chegar onde já chegou. E atenção porque esse destino onde ela já chegou não é definitivo, nem fixo. Terá de continuar a trabalhar para o superar, sendo isso mesmo que ela defende como principio. É essencial manter a vontade de fazer sempre mais e melhor...!

Se gostei? Sim, muito. "Na Vida com Garra - Uma história inspiradora de superação e conquista" de Telma Monteiro foi uma agradável surpresa... Apesar de não ser judoca sinto, de alguma forma, que tenho muitos traços de carácter e, num certo sentido, de (dificil/trabalhoso) percurso em comum com a autora. Identifiquei-me várias vezes com a sua forma de pensar. E, por isso mesmo, ela conseguiu "tocar-me" várias vezes. Sorri muito, mas também me emocionei várias vezes com a sua autenticidade, perserverança e resiliência perante os momentos menos bons pelos quais já teve de passar. É dificil ficar e ser indiferente a tanta garra! Um exemplo a seguir, sem dúvida.

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"Sonho de olhos abertos. Luto todos os dias por isso. Posso não ter a certeza desta «batalha», mas tenho a certeza de como a vou travar. 
No fim, seja qual for o resultado, tudo terá valido a pena. Porque no judo, como na vida, só há uma forma de estar, com garra." [p.257].

https://www.goodreads.com/review/show/1836215599

domingo, 11 de dezembro de 2016

Viagem a Tralalá, de Wladimir Kaminer

"Viagem a Tralalá" de Wladimir Kaminer
Tinta da China, 2012
157 Páginas


Wladimir Kaminer, um russo tornado posteriormente cidadão alemão (vive em Berlim, actualmente), conta em "Viagem a Tralalá", que fica na Crimeia (a Sul da Ucrânia), cinco episódios de viagens distintos decorridos ainda durante o tempo da Guerra Fria: "desencontro de Paris"; "desencanto da América", "desaparecido da Crimeia"; "desviado na Dinamarca" e "desencaminhado na Sibéria". 

Através de uma escrita leve (Kaminer tem outros livros escritos e publicados e trabalha como DJ), ficamos a conhecer alguns aspectos culturais bastante interessantes não só dos russos, como também dos alemães e dos locais por estes visitados. 

Assim, de todos os episódios, os que gostei mais foram: o "desaparecido da Crimeia", porque dá para compreender qual a importância que esta região tem desde sempre para os russos e o modo como estes encaram a Ucrânia enquanto país, um tema muito actual; o "desviado na Dinamarca", porque já tendo tido oportunidade de visitar este país (que adorei) e conhecer um pouco da sua cultura, senti-me a revisitá-lo, senti-me como que em casa; e o "desencaminhado na Sibéria", porque o autor "brinca" com a ideia da Sibéria como desterro opondo-a à Sibéria como destino de uma viagem de bicicleta, um local onde se podem travar conhecimentos com a população local e conhecer russas que, ao que parece, apreciam muito o homem alemão (comparativamente ao finlandês, por exemplo).

No essencial, o melhor deste livro é mesmo o facto do autor já não escrever apenas como um russo, mas como um russo germanizado porque vive desde há vários anos na Alemanha...!  

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"Quer em São Petersburgo quer em Moscovo, ao passar pelas ruas pensava repetidamente: «Sim, o Martin ia gostar disso». De facto, nunca vi em Berlim tantas pessoas felizes como nas ruas de Moscovo quando fazia vinte graus negativos. E com vinte e cinco graus negativos os meus compatriotas pareciam ainda mais felizes. Depois de observar cuidadosamente o fenómeno, cheguei à conclusão de que, em caso de temperaturas extremamente baixas, a afabilidade russa não se deve apenas ao prazer de enfrentar dificuldades, mas também em grande parte a um elevado consumo de álcool."
[pp. 151 e 152]

https://www.goodreads.com/review/show/1832769775

quarta-feira, 7 de dezembro de 2016

O Tempo dos Amores Perfeitos, de Tiago Rebelo


"O Tempo dos Amores Perfeitos" de Tiago Rebelo
Edições Asa, 2013
612 Páginas

Tiago Rebelo conta-nos em "O Tempo dos Amores Perfeitos" a história do seu antepassado Carlos Augusto de Noronha e Montanha, um militar do exército que é destacado para Luanda, pouco tempo depois do Ultimato inglês. E mistura alguma ficção, apoiado pela consulta de algumas obras sobre a ex-colónia portuguesa neste período, o que permite ficar a conhecer um pouco melhor como era a vida em Luanda e mais interior de Angola, a relação com as tribos locais, o processo de ocupação e exploração do território. 

O resultado é uma obra extensa (um calhamaço, pois então; afinal são seiscentas e tal páginas), mas interessante. O autor não se perde demasiado na vida desta ou daquela personagem, saltando entre elas rapidamente, sem que o leitor perca o fio condutor à narrativa e o tédio o visite. E descreve os cenários com mestria, fazendo o mesmo com o carácter das personagens. 

Em síntese, este pareceu-me um bonito romance histórico, escrito com paciência e cuidado, revelando a coragem, a teimosia, a paixão e a loucura não só da personagem de Carlos, como também da de Leonor e o papel que as mesmas podem desempenhar nas nossas escolhas e no rumo que a vida toma. Às vezes, tudo sai tudo ao lado...! 

https://www.goodreads.com/review/show/1803121522

quinta-feira, 1 de dezembro de 2016

Uma Noite em Lisboa, de Erich Maria Remarque


"Uma Noite em Lisboa" de Erich Maria Remarque
Edições Saída de Emergência, 2010
218 Páginas


Erich Maria Remarque dá-nos em "Uma Noite em Lisboa" um retrato exímio do que é ser refugiado, mas sobretudo do que é ser refugiado no período do Nacional-Socialismo, do que é ser perseguido pelas forças do poder e ser despojado dos seus direitos de cidadão. 

A obra escrita nos anos sessenta por um autor alemão, acusado de ser descendente de judeus franceses e tendo tido os seus livros queimados e banidos pelo regime, constitui-se como um inolvidável testemunho da época a que se refere, a da Segunda Guerra Mundial e do desejo de muitos perseguidos (judeus e não judeus) de chegarem a Lisboa e partirem para os EUA, terra da liberdade, mantendo a sua actualidade ainda hoje. 

Esta obra, em que parte da história ocorre e termina mesmo em Lisboa (o que sublinha a importância da cidade portuguesa neste período), é daquelas que têm mesmo de ser lidas não só para se compreender um passado mais recente, como também o presente, sem perder de vista o futuro que está para chegar...! 

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"De dia Lisboa tem uma qualidade ingénua e teatral que encanta e cativa, mas à noite é uma cidade de conto de fadas, descendo em terraços iluminados até ao mar, como uma senhora de vestes festivas a ir ao encontro do seu misterioso amante." (p.98)

https://www.goodreads.com/review/show/1803123928

quarta-feira, 30 de novembro de 2016

Uma Deusa para o Rei, de Mari Pau Domínguez




"Uma Deusa para o Rei" de Mari Pau Domínguez 
Editorial Presença, 2012
391 Páginas



Mari Pau Domínguez conta-nos a história de uma amante de Filipe II de Espanha, Filipe I de Portugal, Isabel de Osório, dama de companhia da imperatriz Isabel, e da relação que ambos mantiveram durante vários anos, à margem dos casamentos reais e por conveniência política.

A leitura é absorvente e a prosa está escrita de tal forma que é possível sentir a força do sentimento de ambos, sobretudo de Isabel, passando-se o mesmo com o seu desespero e a sua dor. 


Na verdade, a autora recupera a figura de Isabel de Osório, tantas vezes esquecida, e leva-nos a percorrer as aventuras e desventuras por que passou por causa da paixão que tinha por Filipe II, num misto de verdade histórica e ficção. 


O resultado é um excelente romance histórico, daqueles que se vivem intensamente da primeira à última página, e corroborando com a minha perspectiva de que quem mantém mais do que uma mulher, não gosta na prática de nenhuma. Gosta, isso sim, de si próprio...!


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"Quando alguma coisa se deseja com desmesura e chega ao momento em que se cumpre o sonho, esquiva-se a capacidade de acreditar. E, quanto mais longa tiver sido a espera, mais ilusório irá parecer tê-lo conseguido." (p.322)

https://www.goodreads.com/review/show/1803119991

quinta-feira, 17 de novembro de 2016

O Gosto Proibido do Gengibre, de Jamie Ford


"O Gosto Proibido do Gengibre" de Jamie Ford
Porto Editora, 2012
316 Páginas

"O Gosto Proibido do Gengibre" é um livro com uma história muito bonita... 

O autor, Jamie Ford, alterna dois momentos distintos da história ao longo do livro: o passado, aquando da Segunda Guerra Mundial, e o presente, relativo ao ano de 1986, sendo que esta alternância confere ritmo e aumenta, na minha perspectiva, o interesse na história, que remonta a um período algo conturbado da história mundial, da história norte-americana e da história japonesa. 

Um jovem americano de origem chinesa (mas que o pai faz questão que não esqueça jamais o facto de que é chinês, obrigando-o a exibir um crachá diariamente), Henry, conhece uma jovem americana de origem japonesa, Keiko, de quem se torna amigo e com quem desenvolve o gosto pela audição de música jazz. 

Após o ataque japonês à base norte-americana de Pearl Harbor, situada no Pacífico, os japoneses - nos quais se encontram Keiko - foram enviados para campos de internamento, desapossados dos seus bens, dos seus amigos (não japoneses) e das suas rotinas.

Este livro conta, assim, um episódio pouco conhecido da história dos EUA, mas negro e incompreensível... O que é que os japoneses (entre os quais se contavam crianças, note-se) que viviam nos EUA, muitos dos quais desde sempre, outros tendo aí nascido tinham a ver com o ataque a Pearl Harbor...? Para se verem impedidos de viver a sua vida livremente? O mundo aponta sempre o dedo às atrocidades que os alemães (nazis) cometeram contra os judeus, mas infelizmente o mundo também está salpicado de histórias destas... Um pouco diferentes é certo, mas igualmente tristes, lamentáveis, condenáveis, vergonhosas...! 

Isto irá implicar com a relação de Henry e Keiko, tendo consequências para o seu futuro, para o qual a intervenção fanática do pai de Henry também irá contribuir de forma determinante. Esta história é, como disse, muito bonita e apesar de toda a odisseia (que não é forçada e é perfeitamente enquadrada no contexto) tem um final doce, digamos assim, levando-nos a pensar mesmo que "depois da tempestade vem a bonança". 

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https://www.goodreads.com/review/show/1802420822

domingo, 13 de novembro de 2016

Cartas de Amor de Fernando Pessoa e Ofélia Queiroz, de Fernando Pessoa e Ofélia Queiroz


"Cartas de Amor de Fernando Pessoa e Ofélia Queiroz" de Fernando Pessoa e Ofélia Queiroz
Assírio & Alvim, 2015
367 Páginas


Ofélia Queiroz foi, tanto quanto se sabe, o que de mais próximo Fernando Pessoa teve de ser sua namorada. O "namoro" entre ambos esteve longe de ser, como se poderá perceber pela troca de correspondência, apenas platónico (foi mais algo cuja rotina era a "distância"), mas facilmente se percebe que o que Ofélia sentia por Fernando Pessoa seria mais forte do que aquilo que ele sentia (se é que sentia...) por ela...

E aqui é que reside o problema desta obra para mim: aborrece-me de morte, para não dizer mesmo que me angustia e magoa, o facto de Ofélia ter estado tantos anos à espera de Fernando Pessoa, quando ele não estava para aí virado... Como se depreende pela sua ausência de respostas, pelo seu silêncio a dada altura e, numa fase mais inicial, pela pouca e irregular frequência das mesmas. Tudo parecia dificil e impossível!

Ainda assim, as cartas de Fernando Pessoa têm umas tiradas soberbas contrastantes com as cartas transbordantes de sentimentalismo de Ofélia. Apesar de serem poucas, e de Fernando Pessoa parecer ceder a pena com frequência a Ricardo Reis em vários momentos devido à sua característica de "desmancha-prazeres" (ainda que na troca de correspondência se verifique apenas a visita manifesta e declarada de Álvaro de Campos em alguns momentos), é um regalo lê-lo de todas as vezes que é possível.

Gostei da obra, mas preferia outro desfecho e preferia que a paixão "ardente" de Ofélia tivesse tido uma feliz correspondência. É um desperdicio de tempo e de vida esperar por alguém que não quer passar... E eu ainda tenho uma réstia de idealismo e gosto de acreditar em finais felizes!

*
"O Tempo, que envelhece as faces e os cabelos, envelhece também, mas mais depressa ainda, as afeições violentas. A maioria da gente, porque é estúpida, consegue não dar por isso, e julga que ainda ama porque contraiu o hábito de se sentir a amar. (...) As criaturas superiores, porém, são privadas da possibilidade dessa ilusão, porque nem podem crer que o amor dure, nem, quando o sentem acabado, se enganam tomando por ele a estima, ou a gratidão, que ele deixou. 
Estas cousas fazem sofrer, mas o sofrimento passa. Se a vida, que é tudo, passa por fim, como não hão-de passar o amor e a dor, e todas as mais cousas, que não são mais que partes da vida?"
[p. 192]

https://www.goodreads.com/review/show/1802865964

sexta-feira, 4 de novembro de 2016

A Túlipa Negra, de Alexandre Dumas

"A Túlipa Negra" de Alexandre Dumas
Civilização Editora, 2012
223 Páginas


"A Túlipa Negra" é uma história de inveja, roubo e mentira, mas também é um exemplo de que quando se chega ao fim o contrário de tudo isto pode vencer. Alexandre Dumas faz com que tudo gire em torno da túlipa negra (até o amor), tão dificil de obter e, por isso mesmo, tão preciosa.

Longe de ser uma obra complexa, a beleza de "A Túlipa Negra" encontra-se na simplicidade da escrita de Dumas. Nos títulos que antecedem cada capítulo de forma clara e orientadora do rumo desta história que se passa no século XVII.

Gostei deste livro de Dumas, não só porque sou de alguma forma fã do mistério e de toda a mística que habitualmente envolve as tulipas da cor negra, como também porque esta história tem um final digno de um "e foram felizes para sempre", próprio das histórias de encantar e que, ainda que não seja sempre verdade, porque não há mal que dure para sempre nem bem que não se acabe, traz esperança aos nossos dias...!


*

"Quando a fatalidade começa a executar uma obra má, é raro que não previna caritativamente a vítima, como um espadachim faz ao adversário para lhe dar tempo a pôr-se em guarda. Quase sempre, estes avisos emanam do instinto do homem ou da cumplicidade dos objectos inanimados, muitas vezes menos inanimados do que se julga geralmente; quase sempre estes avisos são desprezados. "[p.119].

https://www.goodreads.com/review/show/1791069676?book_show_action=false&from_review_page=1

terça-feira, 1 de novembro de 2016

Iberiana, de João Lopes Marques




"Iberiana" de João Lopes Marques
Sextante Editora, 2011
202 Páginas




Este livro não foi escrito definitivamente para mim... Já li outros trabalhos de João Lopes Marques e gostei muito, como foi o caso de "O Plano Merkel" (sobretudo) e "Choque Cultural" (que recomendo vivamente), mas "Iberiana" é diferente. 


A obra começa por pegar no quadro de Pablo Picasso, Guernica, e a partir daí é contada a história e começam a tecer-se as relações com a Iberiana, que eu não consegui perceber. São feitas várias referências ao País Basco e à língua basca e, no entanto, não consegui encontrar um fio condutor na obra que me agarrasse à leitura... 


João Lopes Marques escreve bem, tem carisma na forma como o faz e isso nota-se aqui também. Só que "Iberiana", em termos de argumento, pareceu-me saída da estratosfera e num certo sentido, senti-me a ler um livro de ficção científica... Estilo que não aprecio assim muito. Leio, mas... Mas...


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https://www.goodreads.com/review/show/1791074467

sexta-feira, 28 de outubro de 2016

Um Percurso Político, de Thomas Mann



"Um Percurso Político. Da Primeira Guerra Mundial ao Exílio Americano" de Thomas Mann
Bertrand Editora, 2016
205 Páginas



"Um Percurso Político. Da Primeira Guerra Mundial ao Exílio Americano" trata-se de uma selecção de textos políticos de Thomas Mann, cuja organização foi apoiada pelo Goethe-Institut e pelo Ministério dos Negócios Estrangeiros Alemão. 

A obra compõe-se de cinco textos, ensaios: "Pensamentos em tempo de Guerra" (1914), "Pensamentos a Propósito da Guerra" (1915), "Da República Alemã" (1922), "Alocução Alemã. Um Apelo à Razão" (1930), "O Meu Irmão Hitler" (1933) e "A Alemanha e os Alemães" (1945), através dos quais Thomas Mann dá o seu testemunho sobre o que entende ser o carácter alemão, a germanidade, as razões do apoio alemão a Adolf Hitler (que ele crítica de toda a forma e feitio, abominando-o sem rondeios e dando origem a uma das partes mais espantosas de "Um Percurso Político"), sem esquecer, claro, o modo como encara a Primeira Grande Guerra e o Tratado de Versailles e a Segunda Grande Guerra.

Com efeito, este livro permite-nos pensar a partir da pena do alemão, Prémio Nobel da Literatura de 1929, aspectos marcantes da História europeia e, sobretudo, alemã, o que é bastante enriquecedor porque é algo que nos falta com frequência... Conhecer como é que os alemães se pensam a si próprios e pensam o mundo!

*
"E é por isso que o afirmo: a melhor, a verdadeira segurança da França é a saúde de alma do povo alemão. O mundo vê bem como a crise geral política e económica afectou esta saúde que, para a Alemanha, se agravou perigosamente com condições de paz insensatas. (...)" [pp. 135 e 136]

https://www.goodreads.com/review/show/1792031358

Amor Entre Guerras, de Sofia Ferros


"Amor Entre Guerras" de Sofia Ferros
Casa das Letras, 2014
335 Páginas



Baseado numa história verídica, a dos bisavós da autora, "Amor Entre Guerras" passa-se na Primeira Guerra Mundial e ainda abrange o período pós Guerra e início da Segunda Guerra Mundial. A narrativa centra-se no jovem médico Miguel, que parte para França para integrar o Corpo Expedicionário Português (CEP), sendo aí que conhece a sua futura esposa, uma francesa defensora da liberdade e dos principios do Comunismo. Desde o momento em que se encontram, pelas circunstâncias da guerra, as suas vidas transformar-se-ão, mas é também a maneira de ser de Alexandrine e as consequências sofridas por um acidente, em Lisboa, que irão ditar o rumo da vida do casal em Lourenço Marques. 

Com efeito, "Amor Entre Guerras" foi uma surpresa para mim, do mesmo modo que o foi o excelente trabalho de pesquisa e redacção desta obra realizado por Sofia Ferros. Tanto quanto pude perceber, esta é a sua primeira obra e que primeira obra...! Irrepreensível. Não há momentos mortos, nem enfadonhos. Às vezes, muitas vezes para ser sincera, é dificil parar de ler porque a leitura é demasiado empolgante para fazer pausas. O modo como a obra termina deixa no ar a possibilidade de uma continuação, que aguardarei com atenção e expectativa. Porque, acreditem, a história promete!

Desde a forma viva como Alexandrine defende a liberdade e a emancipação das mulheres, o modo como se compreende a própria evolução escondida e algo recatada do Comunismo, as referências à cientista Marie Curie, ao modo mal preparado e equipado com que o CEP foi para a Guerra, o próprio clima de repressão e instabilidade vivido em Portugal, assim como o estilo de vida dos portugueses em Moçambique... Tudo torna a história interessante e bem construída em todos os sentidos. 

Além da obra nos permitir evadir, leva-nos igualmente a conhecer um pouco melhor alguns aspectos deste período histórico e a pensar de que modo é que eles poderão ter influenciado e condicionado as vidas das pessoas. Por outro lado, é fácil colocarmo-nos na posição das personagens e num ou noutro momento compreender o porquê de terem tomado esta ou aquela opção. 

Por tudo isto, só posso dizer que gostei muito de "Amor Entre Guerras"!


https://www.goodreads.com/review/show/1791070917


domingo, 23 de outubro de 2016

Uma Espia na Casa do Amor, de Anaïs Nin

"Uma Espia na Casa do Amor" de Anaïs Nin
Vega, 2012
132 Páginas

"Uma Espia na Casa do Amor" deixou-me indecisa entre as 2 e as 3 estrelas... A verdade é que quando me questiono se gostei do livro não consigo dizer que não gostei, mas também não consigo dizer que gostei. 

A meu ver a obra tem um argumento com tudo para dar um livro interessante, no mínimo "agitante": uma mulher que apesar de viver com um homem que a ama decide ausentar-se, de vez em quando, alegando razões profissionais, mas tudo o que faz nesses períodos é experimentar o amor de outros homens, sem qualquer espécie de relação de qualquer tipo... 

No entanto, o interesse do argumento perde-se na sua concretização. A autora tem tiradas inteligentes, dotadas de grande profundidade e reflexão (que admirei bastante e tomei nota porque são dignas de leituras e releituras), mas ao mesmo tempo a forma como começa o livro é confusa, deixando o leitor cheio de dúvidas, e a forma como também apresenta os encontros ocasionais, se volta a referir aos sentimentos de Sabina e  ao modo como o marido a trata é feita atabalhoada, caótica e desorganizadamente. Nem sempre é fácil compreender que se passou de uma coisa à outra e, às vezes, essa transição é abrupta. Por outro lado, a obra não dispõe de capítulos, o que faz com que o leitor tenha de andar à procura do “tempo certo” para fazer uma pausa e isso acaba por cansar um pouco e constituir motivo de algum stress …!

No essencial, a obra concentra-se no desejo de liberdade e independência da personagem principal, que parece não querer amar ninguém, e que sendo infiel, por "necessidade", não sabe como lidar com a culpa (?) e a eventual e hipotética possibilidade de descoberta dessa vida paralela pelo marido. Ainda que a escrita de Anaïs Nin se foque no estado de alma de Sabina, com pouca ou nenhuma relevância dos cenários e a quase ausência de descrições, e seja nessa perspectiva riquissima, a verdade é que no geral o meu maior desejo foi sempre conseguir terminar o livro o mais rapidamente possível... Como se não conseguisse aguentar aquela leitura por mais tempo do que o apenas necessário! 

E é isto.
*
"Como ela aprendera a fazer desaparecer cartas de amor pelo lavabo, a não deixar cabelos no pente emprestado, a reunir os ganchos do cabelo, a apagar vestígios de baton em toda a parte, a sacudir nuvens de pó de arroz. 
Os seus olhos eram como os olhos de uma espia. 
Os seus hábitos eram como os hábitos de uma espia. Como ela punha todas as suas roupas numa cadeira, como se pudesse ser chamada de repente e não devesse deixar quaisquer vestígios da sua presença. (...)"[p. 58]

https://www.goodreads.com/review/show/1791070601