quinta-feira, 23 de dezembro de 2021

"The One-eyed God Odin and the (Indo-) Germanic Männerbünde" de Kris Kershaw


"The One-eyed God: Odin and the (Indo-) Germanic Männerbünde" de Kris Kershaw
Institute for the Study of Man Inc, 2000
306 páginas

"The One-eyed God: Odin and the (Indo-) Germanic Männerbünde" de Kris Kershaw é uma tese de doutoramento acerca do deus nórdico Odin e talvez seja também o livro de Odin. Li-o quase em simultâneo com "Runemarks" de Joanne Harris e ajudou-me a perceber muito das bases sobre as quais está alicerçada a sua história, o que fez toda a diferença. 

Tem apenas um olho e é referido como "cego" embora nunca seja retratado como "cego" e consiga ver todos os mundos. É representado como um homem velho com uma longa barba cinzenta. É um viajante, um deus da guerra e da morte. Tem uma constante obsessão com o conhecimento, em especial o do futuro. 

Assim é descrito Odin. E daí se parte para as relações entre a morte do menino/jovem não guerreiro e o nascimento do homem adulto e guerreiro. Segue-se a homenagem aos antepassados mortos mediante o uso de máscaras em rituais e a existência de "Totentiere" (animais associados à morte) como sejam: o cavalo, o cão, o lobo e o urso. Considera-se a indissociabilidade do cão e do lobo, tão próximos entre si, de Odin e as runas como sinais secretos usados para ajudar os mortos a "prever" o futuro. A floresta surge como o lugar onde os meninos aprendem e se tornam homens guerreiros, terminando com a relação morte - noite - cegueira. 

Aqui e ali são apresentadas muitas outras simbologias e significados relacionados com este deus lobo, deus do bem?!. Kershaw faz efectivamente um belissimo trabalho em introduzir e detalhar tudo o que se relaciona com Odin e, portanto, só posso recomendar este livro a quem se interesse pelo tema. Excelente, perfeito e uma enorme mais-valia para melhor compreender o Paganismo e a Mitologia Nórdica!

https://www.goodreads.com/review/show/4377334478

domingo, 28 de novembro de 2021

"O Profeta" de Kahlil Gibran

 


"O Profeta" de Kahlil Gibran
11x17, 2019
142 páginas

Publicado pela primeira vez em 1923, "O Profeta" fez-me lembrar "Assim Falava Zaratustra" de Friedrich Nietzsche, cujo lançamento remonta a 1883. Em ambos os casos, a montanha está presente ("(...) Mas ao descer a montanha, uma sensação de tristeza apoderou-se de si." [p.9]) e quer o Profeta quer Zaratustra são encarados como sábios, seres iluminados prontos a "espalhar" o seu conhecimento. 

Quem influenciou quem? Nietzsche escreveu "Assim Falava Zaratustra" antes de Gibran ter escrito "O Profeta", pelo que à partida Gibran terá sido influenciado por Nietzsche e não o contrário. E a verdade é que, depois de investigar, confirmei que Nietzsche (tal como William Blake, por exemplo) está entre as influências de Gibran. 

Esta edição de "O Profeta" da 11x17 é composta por duas partes: "O Profeta" e "O Jardim do Profeta", sendo que gostei mais da primeira parte por me parecer mais cuidadosamente composta. Todavia, é na segunda parte que se encontra aquele que é, talvez, a minha passagem favorita neste pequeno e nem por isso menos intenso livro:

"(...)falais da noite como a estação do descanso. Contudo, na verdade, a noite é a estação da procura e do encontro. O dia dá-vos o poder do conhecimento e ensina os vossos dedos a versarem-se na arte de receber, mas é a noite que vos conduz até à casa dos tesouros da Vida. O sol ensina a todas as coisas que crescem a sua ânsia pela luz. Porém, é a noite que as eleva às estrelas. É sem dúvida o sossego da noite que tece um véu de noiva sobre as árvores da floresta e as flores do jardim, proporcionando em seguida um luxuoso banquete e preparando a suite nupcial. É nesse silêncio sagrado que o amanhã é concebido no ventre do Tempo.(...)" [p.100]

A primeira parte é também a mais directa, focando-se cada capítulo num tema/assunto diferente, como: amor, casamento, filhos, dar, comer e beber, trabalho, alegria e tristeza, casas, roupa, comprar e vender, crime e castigo, leis, liberdade, razão e paixão, dor, autoconhecimento, ensinar, amizade, conversar, tempo, o bem e o mal, oração, prazer, beleza, religião, morte. 

Gibran deixa-nos a pensar na hora em que o lemos e muito depois de o termos lido, o que é inquietante e simultaneamente fascinante. Tenho várias passagens sublinhadas sobre as quais, sem querer penso. Deixo-vos mais algumas porque a leitura de "O Profeta" é, de facto, inspirador e recomendo vivamente. 

"(...) permiti que haja espaço na vossa união. (...) Cantai e dançai e sede alegres, mas permiti ao outro estar sozinho (...). (...) E permanecei juntos, embora não demasiado perto (...)" [pp. 18 e 19]

"(...) Quando vos dais a vós próprios é que dais verdadeiramente. (...)" [p.22]

"(...) Quando estiverdes alegres, olhai para o fundo do vosso coração e descobrireis que só aquilo que vos deu tristeza é que vos pode dar alegria. Quando estiverdes tristes, olhai de novo para o vosso coração, e vereis que, chorais por aquilo que foi o vosso deleite. (...)"[p.30]

"(...) Só podereis ser livres quando até o desejo de liberdade se transformar num arnês e quando deixardes de falar em liberdade como sendo um objectivo e uma satisfação. Sereis livres, sim, mas não quando a preocupação deixar de consumir os vossos dias, nemquando as vossas noites forem despojadas de mágoa e necessidade. mas quando estas coisas rodearem a vossa vida e conseguirdes erguer-vos acima delas nus e soltos. (...)" [p.45]

"(...) Alguns de vós chamaram-me distante, embriagado na minha própria solidão. E dissestes: "Ele convive com as árvores da floresta mas não com os homens" e "Senta-se sozinho no topo das colinas e olhade cima para a cidade". É verdade que subi colinas e caminhei por lugares remotos. Como poderia eu ter-vos visto senão de uma grande altura ou a uma grande distância? Como pode alguém ficar perto se não estiver longe?(...)" [p.80]



https://www.goodreads.com/review/show/4357382292

quarta-feira, 24 de novembro de 2021

"Milena und die Briefe der Liebe" de Stephanie Schuster



"Milena und die Briefe der Liebe" de Stephanie Schuster
ATB, 2020
368 Páginas

Quando parti para a leitura de "Milena und die Briefe der Liebe" estava à espera de algo ligeiramente diferente do que acabei depois por encontrar e passo a explicar. Duas foram as razões principais que me levaram a querer ler este livro: a relação de Milena com Franz Kafka, autor de um dos meus livros preferidos, "O Processo"; e a paixão de Milena pela escrita, algo que temos em comum. 

A verdade, porém, é que boa parte do livro foca-se essencialmente em Milena antes de Kafka. Só muito depois de lida mais de metade do livro é que assistimos à construção da relação entre ambos, iniciada com a troca de correspondência de Milena, que muito anseia traduzir os trabalhos do autor de alemão para checo. Isto aborreceu-me. Ainda que eu compreenda a lógica de enquadrar todo o percurso de Milena anterior a Kafka, considero que a autora se perde demasiado em detalhes de aspectos menores e o estilo de escrita usado para apresentar Milena no início soa-me um pouco ao piroso romantismo de cordel. 

Quando começa a escrever ao escritor checo, Milena Jesenská, flha de um médico e na altura a viver em Viena, está casada com Ernst Pollak vivendo um casamento de fachada. Ela ama-o, ele parece totalmente desinteressado, o que a deixa frustrada e a dado momento a leva a procurar investir num trabalho que realmente aprecie... É, deste modo, que se inicia a sua carreira como jornalista. Também é através de Pollak que Milena conhece Kafka vários anos antes em Praga, mas tanto quanto se percebe esse primeiro contacto é mais um contacto de "vista" do que um contacto de facto. A frustração amorosa leva-a a procurar viver a sua paixão pela escrita... e, para além do jornalismo, procura encontrar satisfação na tradução. Lembra-se, então, de Kafka. 

É a partir da entrada em cena de Kafka que, na minha perspectiva, "Milena und die Briefe der Liebe" adquire um novo interesse. Schuster apresenta-nos um romance de cartas, platónico, que não leva a lado nenhum, mas que dá a Milena uma nova perspectiva da vida amorosa e profissional. Como se Kafka acabasse por ser a "peça-chave" da sua vida... E, pelos vistos, foi de facto. 

Mas... Eu não consegui adorar a forma de escrita de Schuster nem a figura de Milena (mistura de infantil com caprichosa com ingénua/sonhadora). Aliás, até a figura de Kafka me conseguiu, por vezes, irritar da forma como foi apresentada. 

Por isso, dou-lhe apenas três estrelas. Acho que estava à espera de outra coisa, sendo que aquilo de que gostei sobretudo foi de conhecer todo o enquadramento histórico que rodeou a relação entre estas pessoas na realidade. 


https://www.goodreads.com/book/show/56054844-milena-und-die-briefe-der-liebe

quinta-feira, 28 de outubro de 2021

"Mademoiselle Coco und der Duft der Liebe" de Michelle Marly




"Mademoiselle Coco und der Duft der Liebe" de Michelle Marly
ATB, 2018
481 Páginas

"Mademoiselle Coco und der Duft der Liebe" de Michelle Marly encontra-se traduzido para língua portuguesa com o título "Mademoiselle Chanel e o Perfume do Amor" publicado no ano passado pela editora Planeta. 


É o terceiro livro que leio, romanceado, acerca de Coco Chanel e posso dizer que a forma como Marly a apresenta é completamente diferente do que li antes, até porque aqui o foco da história não é bem a vida de Chanel, mas sim o desenvolvimento do icónico perfume Chanel N.º 5. 


E é absolutamente fascinante a forma como o perfume é criado, estando intimamente ligado à vida de Chanel... A duas das suas relações amorosas: Boy Capel e Dimitri Romanov. O primeiro, seu grande amor, morre num acidente de viação, deixando-a numa tristeza sem fim que apenas consegue ultrapassar quando decide criar um perfume capaz de imortalizar esse mesmo amor. O segundo, com quem se envolverá emocionalmente, ajudará Chanel nessa busca/criação do perfume "perfeito". 


Li-o na sua versão original em alemão e adorei. A forma como o livro está escrita é muito viva, chegando a parecer que também nós estamos no meio da acção e somos personagens desta história real. Diria que é uma boa leitura quer para admiradores/interessados na vida de Coco Chanel quer para curiosos acerca da história do perfume Chanel n.º 5, cujo cheiro não aprecio, mas aprecio como e porquê foi criado. 5 é a combinação do masculino 3 com o feminino 2, é o número místico do amor , o "bouquet de Catherine"... E mais não digo, leiam que não se vão arrepender...!


https://www.goodreads.com/review/show/4096987057

 

quinta-feira, 15 de julho de 2021

"A Receita da Felicidade" de Deepak Chopra



"A Receita da Felicidade" de Deepak Chopra
11x17, 2019
126 Páginas


 "A Receita da Felicidade" é um livro interessante ainda que eu desacredite na existência de uma receita para ser feliz. Porquê? Porque somos todos diferentes antes de mais. E o que me faz feliz a mim pode não fazer outra pessoa feliz. 

Todavia, entendo que o caminho para a felicidade, se lhe quisermos chamar desta forma, poderá estar na escolha da simplicidade. Porque é aí que reside, a meu ver, a essência de tudo. 

Voltando a "A Receita da Felicidade" propriamente dita, parece-me que o autor conseguiria apresentar o seu argumento num terço de páginas. São 7 as chaves da sua receita: consciência do corpo, a verdadeira autoestima (interna), desintoxicação da vida, abdicação de ter sempre razão, concentração no presente, a procura do mundo dentro de nós, viver para alcançar a iluminação. De todas estas, a abdicação de ter sempre razão foi a que mais gostei (talvez porque com frequência as pessoas se esquecem que ter razão nem sempre significa ser feliz), a par da consciência do corpo (fundamental e que já conhecia) e da desintoxicação da própria vida, ​e o viver para alcançar a iluminação a que menos gostei (devido ao facto de não ter chegado a conclusão nenhuma). 

Portanto, gostei, mas não gostei muito nem adorei. Muito do que li aqui já me era familiar de um outro livro que li de Chopra e dos vários que li/tenho lido de OSHO. 

https://www.goodreads.com/review/show/4116025057

quarta-feira, 16 de junho de 2021

"A Vida Secreta das Árvores" de Peter Wohlleben



"A Vida Secreta das Árvores" de Peter Wohlleben
11x17, 2020
263 Páginas


Há quem fique fascinado com o que Peter Wohlleben aqui escreve acerca do que sentem as árvores e como comunicam entre si; há quem fique céptico e desvalorize alegando que o autor aqui apresenta corresponde a uma espécie de invenção alicerçada em pseudociência, algo meio esotérico. No que me respeita, enquadro-me na primeira categoria. 

Wohleben serve-se da sua experiência primeiro como guarda florestal e depois como engenheiro florestal, baseando-se igualmente tanto em artigos de imprensa como em artigos cientificos (um dos quais publicado pela Max-Planck-Gesellschaft, uma das maiores importantes e reconhecidas instituições de investigação científica e tecnológica alemã e, talvez até, do mundo) para escrever "A Vida Secreta das Árvores". Este não se trata de um livro científico nem tão pouco ambiciona sê-lo. O facto de utilizar uma linguagem clara, simples e acessível para apresentar ideias que poderiam ser mais complexas pode, a meu ver, justificar o facto de alguns ficarem cépticos com a obra. 

Entre os seus cerca de trinta e seis capítulos, é absolutamente fascinante ficar a saber que os fungos "funcionam como a fibra óptica na internet" (p.20), " a Internet da floresta" (p.58); as raízes são a parte mais importante de uma árvore, o "cérebro da árvore"(p.86); "ao arder, a madeira é climaticamente neutra" (p. 96); as"Árvores idosas são  (...) mais produtivas do que as mais jovens" (p.100); é importante existir floresta no interior para aí potenciar a precipitação (p.108); as árvores restringem a humidade e a sua actividade a partir de Julho (p.139); a noção do tempo é medida pelas árvores através da temperatura e da duração dos dias (p. 149); entre muitas outras coisas...

Gostei bastante e recomendo. 


https://www.goodreads.com/review/show/3972488247

segunda-feira, 31 de maio de 2021

"Madame Curie und die Kraft zu träumen" de Susanna Leonard



"Madame Curie und die Kraft zu träumen" de Susanna Leonard
Ullstein, 2020
464 Páginas


Estamos no início de Outubro de 1926, véspera do dia de casamento da filha mais velha de Marie Curie, Irène que, tal como os pais, decide fazer carreira na ciência. A história começa no cemitério entre as sombras dos ciprestes, o que nos deixa antever o que depois se vem a confirmar: Madame Curie fala para Pierre, seu falecido marido. É aqui que a autora inicia a narrativa e é igualmente recordando, já no próprio dia do casamento de Irène (a 9 de Outubro), o acidente em que Pierre morre atropelado, num dia chuvoso em Paris que a mesma termina. 

Por isso, e apesar do título da obra ser "Madame Curie und die Kraft zu träumen" (Madame Curie e a força para sonhar) diria que a autora consegue transmitir na perfeição o alcance e o significado da presença de Pierre na vida de Marie. Depois da sua morte e pese embora toda a sua garra, inteligência e dedicação à ciência, a cientista não voltou a ser a mesma pessoa.

Entre estes início e fim é contada a história da vida de Madame Curie desde pequena, ainda antes de perder a mãe a irmã, passando pela falta de recursos da sua familia (por azares do destino) até ao esforço - trabalhando, por exemplo, como governanta - que faz para ajudar uma outra irmã, Bronia, a estudar medicina e a preparar a sua própria ida para Paris onde pretendia continuar a estudar. 

Marie Curie tem, para mim (desde os meus 13/14 anos quando a descobri), um significado muito especial pelo esforço, espírito de sacrificio, dedicação e obstinação com que sempre perseguiu a sua paixão pela ciência, mesmo nas condições mais adversas. E também pela forma com que viveu a sua vida com Pierre e se tentou manter firme perante tudo e todos quando, na verdade, estava completamente destroçada por ter perdido o seu grande "pilar" (termo seu) de forma tão trágica. Um exemplo real de como "as árvores morrem de pé"...

E este livro está escrito de uma forma muito bonita e especial, bem estruturada. Gostei mesmo. 


https://www.goodreads.com/review/show/3911266172

sábado, 3 de abril de 2021

"A Vontade de Poder - O Niilismo Europeu" de Friedrich Nietzsche



"A Vontade de Poder - O Niilismo Europeu" de Friedrich Nietzsche
Rés-Editora, 2004
302 Páginas

Este primeiro volume d' "A Vontade de Poder", dedicado ao Niilismo Europeu, é constituido por dez capítulos a saber: I - Posição Gnosiológica, II - Exposição Metodológica, III - O Universo e o Homem, IV - O Homem e o Universo, V - Do Cósmico ao Humano, VI - Modernidade, VII - A Europa, VIII - Decadência, IX - Pessimismo e, X - O Niilismo. 

É a partir do III capítulo que, para mim, o volume se reveste de acrescido interesse. Há um momento ou outro de maior importância nos dois primeiros capítulos -como é o caso da passagem "A paixão do conhecimento prende-se com o fim da existência(...)" e de "(...)o pensador aspira a unir-se às coisas de que se vê separado; e nisso consiste a sua paixão." (p.37) -, mas na generalidade continuo a não ser fã das discussões demasiado abstractas relacionada com as questões metodológicas. Prefiro ir directa ao assunto!

Em termos de pontos fortes, considero plena de significado a relação existente entre prazer e poder (sendo o primeiro "um sintoma da sensação de poder adquirido" - p.119), a ideia de que a vida é "vontade de acumular força" e "esforço para a obtenção de maior poder" (p.145) - "é vontade de poder" (p.175) -, e a definição de que "Um niilista é um homem que acha que o mundo, tal como é, não devia existir e que o mundo, tal como devia ser, não existe".

Por fim, e já numa das últimas páginas do volume, encontrei uma passagem, que de tão bela, merece ser destacada e me recorda o "Assim falou Zaratustra": "um filósofo e um solitário por instinto, que tem aproveitado a vida para viver arredado, fora do mundo, com paciência, contemporização e solidão; espírito corajoso, explorador que, em dada altura, se extraviou nos muitos labirintos do futuro; pássaro profeta, a quem basta olhar para trás para predizer o que há-de vir; sendo o primeiro niilista completo da Europa, após ter levado em si mesmo o niilismo até ao extremo, afastou-se para trás, para fora de si"(p.295).

https://www.goodreads.com/review/show/3370028393

quarta-feira, 31 de março de 2021

"Madame Picasso" de Anne Girard



"Madame Picasso" de Anne Girard
Aufbau Verlag, 2020
467 Páginas


Eva Gouel, também conhecida por Pablo Picasso como "ma jolie", foi a sua segunda musa e companheira, sendo que o livro "Madame Picasso" começa efectivamente a partir do momento em que ambos se conhecem. 

Gouel era dançarina no Moulin Rouge quando conhece Picasso e este ainda vivia com Fernande Olivier, mas a relação entre ambos - sobretudo da parte dele - parecia ter "arrefecido". E, pelo menos pelo que Anne Girard nos faz crer, Gouel vem transformar Picasso, o homem e o artista de uma forma profunda. Ao mesmo tempo, a vida desta dançarina também não será a mesma e acabará por deixar para trás a dança acompanhando e dedicando-se ao pintor. E serão felizes. Até ao momento em que descobre estar doente... 

Este foi mais um interessante romance histórico envolvendo o mundo da arte, aqui dança e pintura, passado maioritariamente em Paris no inicio do século XX. Várias outras personalidades se cruzam nestas páginas, tornando o livro bastante rico do ponto de vista cultural. Rica é, de igual modo, a figura de Pablo Picasso, personagem principal de outro livro que já tinha lido há vários anos e que recomendo: "O Pintor de Sombras" de Esteban Martin. 

O único ponto menos positivo é mesmo o facto da bonita relação entre eles terminar de forma abrupta por causa de uma doença e disso tornar uma boa parte do livro profundamente triste de se ler... Para já nem falar nas últimas páginas. Incrivelmente belas na forma como estão escritas, mas de um carregado dramatismo e de uma tristeza sem fim que, sinceramente, não é o que mais aprecio. 

https://www.goodreads.com/review/show/3857099686

terça-feira, 23 de fevereiro de 2021

"Die Malerin" de Mary Basson




"Die Malerin" de Mary Basson
Aufbau Verlag, 2019
427Páginas


"Die Malerin" [A Pintora] de Mary Basson, originalmente escrito em língua inglesa com o título "Saving Kandinsky" centra-se na figura de Gabriele Münter, uma pintora do Expressionismo alemão e fotógrafa, que salvou os quadros de Wassily Kandinsky e do movimento Blaue Reiter [cavaleiro azul] de cairem nas mãos do Nacional-Socialismo e serem destruídos. 

Após vários anos de ligação amorosa a Kandinsky, de quem também tinha sido aluna, Münter recusou-se a devolver os quadros pintados pelo próprio, quando o advogado deste lhe comunica a decisão do pintor não querer mais encontrar-se pessoalmente com ela (e se ter casado com outra mulher, entretanto). Isto passou-se sensivelmente após a Primeira Guerra Mundial. Aliás, foi a Guerra e o facto de ser russo que o levou a deixar a Alemanha. 

Apesar da depressão e de praticamente ter deixado de pintar, na sequência desta "descoberta" Münter acaba por recuperar e torna-se uma fiel guardiã (juntamente com o homem com quem vive Johannes Eichner, um historiador de arte) desses quadros de Kandinsky até (quase) ao fim da sua vida. Aos oitenta anos, Münter decide doar tudo à Städtische Galerie na Lenbachhaus em Munique. 

A história de Gabriele Münter é muito bonita e este livro tem passagens incrivelmente bem escritas para quem for um admirador de arte e da pintura em particular. O que mais me impressionou na vida de Münter, de quem nunca tinha ouvido falar apesar de ser fã de Kandinsky desde os meus 16 anos, foi a devoção que esta dedicou aos quadros do pintor (e num certo sentido ao próprio pintor) mesmo após a separação. Se não fosse ela, muitos dos quadros que hoje conhecemos e contemplamos talvez não existissem...  


https://www.goodreads.com/review/show/3825429742

quarta-feira, 10 de fevereiro de 2021

"Frida Kahlo und die Farben des Lebens" de Caroline Bernard



"Frida Kahlo und die Farben des Lebens" de Caroline Bernard
Aufbau Verlag, 2019
400 Páginas

"Frida Kahlo und die Farben des Lebens" de Caroline Bernard conta, de forma romanceada, a vida da pintora mexicana Frida Kahlo, de quem eu sou grande admiradora desde há vários anos, quando numa aula de psicologia do ensino secundário nos foi dado a ver o filme "Frida" com Salma Hayek como protagonista. E essa admiração nada tem a ver com as suas convicções políticas nem com o feminismo.

A minha admiração profunda por Frida tem a ver com a forma heróica com que fez frente ao sofrimento e à dor, sem nunca desistir de viver, sem nunca desistir de pintar e dar cores intensas, vivas e garridas à vida até ao fim dos seus dias. 

E, de facto, Caroline Bernard apresenta-nos nesta sua obra um retrato, a meu ver, perfeito de Frida, desde o momento que esta teve aquele doloroso e inimaginável acidente quando o autocarro em que seguia chocou contra um eléctrico, condicionando a sua vida para sempre. A descoberta da pintura como fuga e "remédio" para a dor, uma alternativa ao sonho de estudar medicina que deixou para trás, os abortos tantas vezes retrados de forma surrealista, as traições do pintor Diego Riviera que sempre a amou e nunca a impediram de o amar loucamente também sempre e para sempre.  A força, garra e determinação para remar contra a maré e tentar encontrar alguma felicidade na autêntica revolução que faz à vida e, sobretudo, ao sofrimento físico de um corpo permanentemente doente. Tudo isto está presente e bem marcado em "Frida Kahlo und die Farben des Lebens" que é, sem sombra para dúvidas, um livro belíssimo sobre a pintora!

Adorei.

https://www.goodreads.com/review/show/3528239802

segunda-feira, 8 de fevereiro de 2021

"Die Dame in Gold" de Valérie Trierweiler




"Die Dame in Gold" de Valérie Trierweiler
Aufbau Verlag, 2018
366 Páginas

Originalmente escrito em francês, com o título "Le Secret d'Adèle", "Die Dame in Gold" de Valérie Trierweiler centra-se na vida de Adele Bloch-Bauer (aqui: https://en.wikipedia.org/wiki/Portrait_of_Adele_Bloch-Bauer_I#/media/File:Adele_Bloch_Bauer,_c1915.jpeg), uma judia aristocrata, retratada por Gustav Klimt neste quadro: https://en.wikipedia.org/wiki/Portrait_of_Adele_Bloch-Bauer_I#/media/File:Gustav_Klimt_046.jpg (e neste também: https://en.wikipedia.org/wiki/Portrait_of_Adele_Bloch-Bauer_I#/media/File:Gustav_Klimt_047.jpg -ambos quadros roubados pelo regime Nazi e só recuperados muitos anos mais tarde pela sobrinha Maria). 

A autora apresenta uma versão de Adele como sendo uma mulher marcada pela morte dos filhos (por aborto espontâneo ou poucos dias após o nascimento), do irmão e, mais tarde, do próprio Gustav Klimt, de quem era amiga e com quem parece ter tido uma relação extra-conjugal ainda que breve. E, de facto, este peso da morte atravessa quase toda a obra, sendo mais acentuado no inicio e no fim da mesma. 

Efectivamente, Klimt surge como um agente libertador deste peso da morte e da dor de Adele. Talvez por essa mesma razão algumas das mais belas passagens deste livro sejam aquelas em que Trierweiler descreve a arte de pintar e, sobretudo, de retratar Adele por Klimt.

À parte disso, a figura de Adele não me causou grande impacto, talvez porque tinha acabado de ler um romance histórico sobre Frida Kahlo, essa autêntica força da natureza na forma como encarava a vida e fazia frente ao sofrimento. Foram mulheres muito diferentes, incomparáveis entre si. Concentrando-me em Adele, Adele preocupava-se em ajudar os desfavorecidos e, mais tarde, em apoiar os sobrinhos. Sofre bastante com a perda dos filhos que nunca chegará a ter... Essa foi, tanto quanto dá para compreender, a sua grande mágoa. 

Paralelamente, convém sublinhar o interesse manifestado por Adele nas sufragistas e na emancipação da mulher no geral - apresentados de forma superficial - , bem como na literatura (Stefan Zweig, Rainer Maria Rilke, Thomas Mann) e na psicanálise (Sigmund Freud) -parte muito interessante -. "Die Dame in Gold" passa-se antes, durante e pouco depois da Primeira Guerra Mundial, uma guerra para a qual se partiu com a firme convicção de que seria breve (o que em, em certa medida, me recorda um pouco a forma como muitos "partiram" para o primeiro confinamento de há um ano atrás...). 

Gostei muito do livro, embora considere que a autora peca por se forcar muito nessa mágoa de Adele, em especial nos capítulos iniciais da obra, o que carrega em demasia o romance... A título de curiosidade, devo mencionar que este é o terceiro livro que leio tendo o fascinante Klimt como uma das personagens (os outros foram: "O Beijo - A Paixão de Gustav Klimt" de Elizabeth Hickey e "Die Muse von Wien" de Caroline Bernard - aqui: http://outraformadeviajar.blogspot.com/2020/08/die-muse-von-wien-de-caroline-bernard.html).

https://www.goodreads.com/review/show/3807163750

quinta-feira, 14 de janeiro de 2021

"Fear: Understanding and Accepting the Insecurities of Life" de Osho


"Fear: Understanding and Accepting the Insecurities of Life" de Osho
St. Martin's Griffin, 2012
192 Páginas


De todos os livros de Osho lidos até hoje (e já são alguns), este parece-me ser o mais essencial e talvez o mais adequado para ler nestes difíceis e incertos tempos que estamos a viver. 

O medo tem na sua base o medo da morte e, de acordo com o autor, apodera-se de nós logo na nossa infância de forma inconsciente. Mas... Tem também a ver com o tempo e, por inevitabilidade, com a ideia de finitude. É uma neurose, um mecanismo da mente.

Por outro lado, relaciona-se sempre com algo no futuro. É a ausência de amor, o apego ao desejo. 

Osho lembra-me neste livro um outro autor de que gosto bastante, o norueguês Jostein Gaarder, mais conhecido pela sua obra "O Mundo de Sofia". 

Gaarder dedica-se na maior parte dos seus livros a esta ideia de vida-morte, celebrando a vida sem esquecer que quem dá a vida dá, de igual modo, a morte. E este livro do medo de Osho debruça-se muito sobre esta temática, uma das que mais e muito me fascina.

Ler "Fear: Understanding and Accepting the Insecurities of Life" é uma libertação, um empurrão corajoso, sobretudo quando nos sentimos tão pequenos perante o desconhecido, o incerto e o difuso...

Termino apenas referindo que, até à data, este livro não se encontra disponível em português, em Portugal. As duas últimas edições estão esgotadas pelo menos desde há cerca de dois anos, quando comecei a minha descoberta Oshiana, o que é uma pena porque este tema é um essencial. 

p.s.: Na edição que li em inglês, a capa de fundo azul claro está cheia de borboletas, sendo que enquanto simbolo as borboletas representam a imortalidade da alma.

https://www.goodreads.com/review/show/3704354997