segunda-feira, 25 de julho de 2016

Protege o teu Amor, de J.C.Reed



"Protege o teu Amor" de J.C. Reed
Editorial Presença, 2016
270 Páginas


Comparativamente ao segundo volume desta trilogia, intitulado "Conquista o teu Amor", e ao primeiro, intitulado "Entrega-te ao Amor", a autora faz um esforço notório para ir além da relação (física e anímica) entre Jett e Brooke, procurando introduzir elementos de policial, com um rapto e uma morte que não é bem o que parece e a competição/companheirismo entre elementos de um gangue. O que apesar de ser tratado na maioria das páginas do livro, acaba por ficar em aberto e deixar o leitor meio perdido e a pensar: então, e como é que isto fica afinal?!


Na verdade, a história termina sem que se encontrem resolvidos de todo estes novos elementos (nem os anteriores relacionados com a propriedade italiana), caracteristicos de policial (vou chamar-lhes assim). Aliás, a ideia com que fiquei é que a autora se estava a esforçar por construir uma estrutura sólida, mais robusta e de um momento para outro, com pressa de construir outra eventualmente e/ou de se livrar rapidamente desta, abandona-a a meio e dá a obra por concluida. Esta é a principal crítica que lhe faço. Um pouco mais de cuidado e atenção ao modo como a história é fechada será aconselhável. 

Por outro lado, e de uma maneira geral, sinto que a escrita de J.C.Reed evoluiu positivamente, para melhor, procurando ir um pouco mais além do que seria esperado num livro deste género literário e, sobretudo, do tipo de escrita que começou por usar no primeiro volume da trilogia. 
*
"A vida tem uma maneira especial de revirar tudo. Às vezes, não conseguia evitar a sensação que estávamos todos presos dentro de um copo chamado «vida». Éramos como dados chocalhados de um lado para o outro, que depois eram lançados. Prontos para sermos testados e jogados. Prontos para arriscar e enfrentar o impensável. Prontos para perder e sermos magoados. E, independentemente do nosso estatuto social ou do dinheiro que possuíamos, aquilo poderia afectar qualquer um, a qualquer momento e em qualquer lugar. Estávamos todos à mercê do copo agitado chamado «vida»."(Reed, p. 63)

https://www.goodreads.com/review/show/1701767249?book_show_action=false

segunda-feira, 18 de julho de 2016

Alentejo Prometido, de Henrique Raposo

"Alentejo Prometido" de Henrique Raposo
Fundação Francisco Manuel dos Santos, 2015
107 Páginas
"Alentejo Prometido" de Henrique Raposo lê-se rápido, sem demoras. Não é um livro maçador, mas também não é um tratado sobre o Alentejo. É acima de tudo a perspectiva do autor (a partir da experiência da sua família materna e paterna) que figura neste seu retrato desta zona do país. Por vezes, com um estilo mais mordaz, é verdade, mas parece-me que sem malícia. E esse seu estilo característico chega mesmo a conferir uma certa vivacidade à leitura em certos momentos... (Pese embora haja alturas em que esse estilo possa ser em demasia para aqueles que estão a ler um trabalho seu pela primeira vez e não o conhecem de todo.)

Por outro lado, não é só sobre a sua experiência com as suas raízes do Alentejo que o autor escreve, Raposo procura encontrar reflexos em dados estatísticos, que corroboram algumas das suas percepções, bem como em outros autores que anteriormente escreveram sobre o Alentejo de forma ficcionada ou não. 

Há várias ideias que aqui são abordadas e que eu já tinha ouvido ou lido em algum lado. O suicidio tantas vezes aí verificado é uma delas, mas discordo do autor quando de alguma forma parece "condenar" quem se suicida. Não sou apologista do suicidio (não resolve nada e quem o comete já primeiramente a prejudicar-se a si próprio) nem sou crítica. Respeito. O suicidio é uma fuga. Uma fuga de alguém que não aguenta mais a pressão de determinada situação e cuja necessidade de ajuda/apoio passou ao lado de quem estava por perto (desantento) ou podia aproximar-se. É acima de tudo um acto de desesperado desespero. Penso que não deve ser condenado nem vangloriado. Deve, isso sim, ser evitado e será se todos passarmos a estar mais atentos a quem nos rodeia... E menos concentrados em nós mesmos. 

Depois, há a aridez que se sente mais marcadamente no Verão, por exemplo, o tal cheiro a queimado sem que haja incêndio algum... A menor quantidade de água se comparado com a zona Norte do país. Isto são aspectos que Raposo refere e que, embora não conhecendo na totalidade o Alentejo (conheço melhor o Norte do país, admito), senti e constatei quando lá fui (e não conheço ainda o Litoral) nos sitios em que estive. De todas as vezes. Porém, isso não lhe tira a beleza, nem o interesse. Torna-o diferente, único. Merecedor de uma ou mais visitas. 

"Alentejo prometido" pode resumir-se a isto: o olhar de Henrique Raposo sobre o Alentejo. Não é uma verdade absoluta (que não existe), é apenas a sua perspectiva. E penso que é com isto em mente que a obra deve ser lida.

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"Eram duas da tarde, e a esta hora o Alentejo não cheira nem soa a nada. O calor abafa tudo. Só sentimos o pó, na garganta já devidamente terrincado, e no rosto onde se junta o suor para formar uma película pastosa que nos envolve como uma segunda pele.(...) 
À tardinha o Alentejo já tem cheiro, a resina das estevas, o mel das figueiras, o odor a haxixe dos eucaliptos, o cheiro da própria terra que tem sempro um leve travo a incêndio apesar de não haver incêndios. (...)" (Raposo, 2015, pp. 17, 33 e 34)
 

https://www.goodreads.com/review/show/1680074044

domingo, 17 de julho de 2016

Dei o meu coração a África. A vida extraordinária de Joan Root, de Mark Seal



"Dei o meu coração a África. A vida extraordinária de Joan Root" de Mark Seal
Editorial Presença, 2011
279 Páginas

"Dei o meu coração a África" de Mark Seal oferece-nos, sem dúvida, uma biografia cativante da primeira à última página sobre a vida de Joan Root, uma queniana de origem britânica, cineasta da vida selvagem e ambientalista. 

Joan Root começou a sua vida no Lago Naivasha no Quénia e é também nele e por ele que morreu de forma violenta e injusta em 2006 (um video sobre isto pode ser visto aqui:https://www.youtube.com/watch?v=8HO3v... ). A sua história é belissima: de introvertida e "mulher sombra" de Alan Root (também ele cineasta da vida selvagem africana), que amou até ao fim dos seus dias, a empenhada, destemida e apaixonada activista, Root dedicou os seus quase 70 anos de vida a estudar, a dar a conhecer, a preservar e a desfrutar da natureza queniana. 

Nesta obra, Mark Seal, jornalista de profissão, escreve sobre alguém verdadeiramente inspirador, cuja vida não escapou à cegueira dos interesses económicos (e nada ecológicos) na região onde habitava, a partir do testemunho do ex-marido Alan e de vários amigos e conhecidos de Joan, bem como dos diários deixados por ela. É fácil compreender Joan através das palavras de Mark Seal, do mesmo modo que é fácil ficar a conhecer a sua vida através das várias fotos existentes a preto e branco ao longo das dezasseis páginas centrais existentes no livro. E sim, vale muito a pena lê-lo e conhecer a história desta mulher de raízes europeias nascida, criada e morta em África. 

De assinalar é também, a título de curiosidade, o facto de se ter pensado fazer um filme para o cinema sobre Joan Root, que seria representada pela actriz Julia Roberts (ver aqui:http://aboutjulia.com/2010/03/joan-ro... ). No entanto, parece que este filme não passou de uma ideia, sendo que a última vez que se falou nele foi em 2010... E já passaram seis anos!
*
"Numa tarde idílica, em que Edmund e Lilian tinham ido fazer um piquenique a Crescent Island, uma península verdejante que se projecta para o lago Naivasha, a cerca de meia hora de Nairobi, o casal concebeu a sua única filha. Assim, o círculo da vida de Joan começou no lago, onde nasceu e viria a morrer. Desde o primeiro momento do seu nascimento, a sua vida nunca foi igual à das outras rapariguinhas. «Um amigo tinha-me deixado uma grande macaca com os braços muito compridos, chamada Mabel», contou Edmund mais tarde a um jornalista. «Tinha a mania de roubar gatinhos, cachorros, tudo o que fosse jovem. Um dia alguém olhou por acaso para o quarto de Joan e estava lá a Mabel, empoleirada na janela, com a bebé nos braços. Trocámos a nossa filha por uma banana.»
Mas nunca a recuperaram "verdadeiramente". Desse dia em diante, Joan Thorpe nunca mais deixaria os braços da vida selvagem." (Seal, 2011, pp. 29 e 30)

https://www.goodreads.com/review/show/1680084982

quarta-feira, 13 de julho de 2016

Suite Francesa, de Irène Némirovsky

"Suite Francesa" de Irène Némirovsky
Publicações Dom Quixote, 2015
579 Páginas


"Suite Francesa" é um romance de Irène Némirovsky, inacabado, mas cuja mensagem passagem completa: os estados, os sentimentos e as angústias que a ocupação alemã de França durante a Segunda Guerra Mundial causou. 

Constituída por dois livros (“Tempestade em Junho”, relatando a fuga de vários franceses à chegada aos alemães, e “Dolce”, mais concentrado na vida de uma aldeia já na presença dos alemães e na relação estabelecida entre estes e os locais) em vez dos cinco idealizados, Némirovsky queria que esta sua obra tivesse cerca de 1000 páginas; ficou-se, todavia, pelas 500 e poucas, devido à sua prisão em Julho de 1942 e sua consequente morte, um mês depois, em Auschwitz. Ucraniana de origem judaica, Némirovsky vinha de uma família abastada que chegou a Paris, em 1919, para fugir às consequências da revolução de 1917 na Rússia Soviética. Trabalhou como escritora até ao momento da sua prisão, que não se conseguiu evitar. A obra acabaria por ser publicada posteriormente graças a uma das suas duas filhas, Denise Epstein (http://www.telegraph.co.uk/news/obituaries/10023679/Denise-Epstein.html  e http://www.express.co.uk/entertainment/films/563937/Suite-Francaise-author-Irene-Nemirovsky-Auschwitz-tragedy ), e receberia o Prémio Renaudot em 2004.

Em Portugal, várias das suas obras encontram-se publicadas pela Relógio D'Água, embora "Suite Francesa", entretanto adaptada para filme (ver trailer aqui: https://www.youtube.com/watch?v=azoDJwdhaWI ), tenha sido publicada pela Dom Quixote. Mais do que um romance histórico, esta obra é um romance escrito na e sobre a História, já que a autora vive no período abordado e ao que parece também teve de dar alojamento a militares alemães na sua casa. "Suite Francesa" é, por isso mesmo, uma história viva, porque ainda que ficcionada pela sua autora, baseia-se na experiência desta relativamente à ocupação nazi de França, estando plena de realismo. É escrita durante a Segunda Guerra Mundial e sobre ela, testemunhando os horrores da Guerra, sem os mitigar ou atenuar.

A sua escrita é completa, pensada, nada superficial. O leitor lê e consegue sentir o mesmo que as personagens, consegue colocar-se no lugar delas, pensar como elas e reflectir sobre isso. Némirovsky queria que "Suite Francesa" fosse cinematográfica e conseguiu. Toda a obra parece um filme, sendo que ainda que não tenha sido acabada, isso não impede a compreensão do que foi a chegada e a permanência dos alemães em França nos anos 40: chegavam e faziam-se hóspedes dos franceses sem mais nem mais, sendo que, muitas vezes, isso acabava por criar problemas entre os casais ao originar relacionamentos entre militares alemães e mulheres francesas (casadas ou não), que depois da Guerra terminar acabariam por sofrer nas mãos dos próprios franceses, acusadas de serem “colaboradoras horizontais” (alguns exemplos em imagem poderão ser encontrados aqui http://www.ideafixa.com/historia-as-colaboradoras-nazistas-da-segunda-guerra-mundial/ ). Penso, pois, que é por causa deste aspecto da ocupação alemã que a obra se chama “Suite Francesa”.

Face a tudo isto, só posso recomendar a leitura da obra…! 
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"Sabemos muito bem que o ser humano é complexo, múltiplo, dividido, cheio de surpresas, mas é preciso o tempo da guerra ou grandes mudanças para o vermos. É o espectáculo mais apaixonante e terrível, pensou ainda; o mais terrível por ser o mais verdadeiro; não podemos gabar-nos de conhecer o mar sem o ter visto tanto em tempos de bonança como em tempos de tempestade. Só quem observou os homens e as mulheres numa época como esta é que os conhece verdadeiramente, pensou. Só esse se conhece a si próprio." (Némirovsky, 2015, p.508)

https://www.goodreads.com/review/show/1680084744?book_show_action=false


sexta-feira, 1 de julho de 2016

A Vida Secreta de Stella Bain, de Anita Shreve




"A Vida Secreta de Stella Bain" de Anita Shreve
Clube do Autor, 2014
256 Páginas


"A Vida Secreta de Stella Bain" de Anita Shreve tem um bom argumento, potencial para ser um muito bom livro, mas na minha perspectiva falha em algumas coisas, nomeadamente nas transições entre capítulos (o último capítulo do livro, por exemplo, parece que nos cai de paraquedas e é demasiado breve, curto, dando a sensação de que a autora quer terminar a história depressa) e na ausência de profundidade/intensidade da história (o passado amoroso da personagem principal parece passar por ela na história, como se nada fosse, dando a sensação de que não terá sido assim tão importante como o leitor poderá ser levado a pensar numa fase inicial, sendo que o próprio desfecho amoroso também parece algo superficial, como se a autora tivesse a necessidade de "arrumar" a vida da personagem de repente). 

Por outro lado, achei muito interessante a forma como a autora, Anita Shreve, aborda o papel do trauma de guerra nas gerações que estiveram directamente envolvidas no combate na Grande Guerra, das mulheres no conflito (trabalhando como pacifistas, quer como enfermeiras/auxiliares de enfermagem, quer ainda como condutoras de ambulâncias) e o modo como as suas vontades/desejos/manifestações eram até aí desconsideradas (vivendo "forçosamente" na dependência das famílias e dos maridos), e da psicanálise/terapia verbal/desenho terapêutico. 


Quanto à escrita em si mesma, Shreve escreve de uma forma bastante acessível e consegue captar a atenção do leitor desde o início sem grande dificuldade... No geral, gostei do que li, mas lá está... Podia ter gostado mais!


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"«Em Inglaterra, esforçamo-nos por compreender as vítimas de trauma de guerra. No início da guerra, os homens afectados por esta perturbação eram acusados de simular doenças e enviados de volta para o mesmo ambiente que eram incapazes de suportar. Hoje em dia, temos hospitais preparados para estes homens, onde recebem várias formas de tratamento. A perda de memória não é um sintoma invulgar do trauma de guerra; na verdade, estes homens registam perdas de memória que se estendem por dois anos, ou possivelmente mais, uma vez que os homens referidos não a recuperaram ainda. (...)" (Shreve, 2014, p. 200).

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