sábado, 30 de abril de 2016

The Invention of Nature, de Andrea Wulf

"The Invention of Nature" de Andrea Wulf
John Murray, 2015
473 Páginas

Vencedor do Costa Biography Award em 2015 na categoria da Biografia, "The Invention of Nature" trata-se de uma biografia sobre Alexander von Humboldt, um geógrafo alemão do século XVIII-XIX, que dedicou a sua vida a observar e a explorar a natureza para a conhecer e compreender. 

A obra de Andrea Wulf, nascida na Índia, crescida na Alemanha e a viver actualmente em Inglaterra, encontra-se dividida em cinco partes: uma primeira relacionada com o período antecedente à partida de Humboldt, em que são abordadas as suas ideias emergentes, e os primeiros anos da sua vida muito moldados pelo que a mãe desejava para o futuro dele e do irmão; uma segunda parte relacionada com a chegada de Humboldt à América do Sul, passando por Llanos (no norte), Orinoco (rio), pela cordilheira dos Andes e por Chimborazo (vulcão), onde o geógrafo procede à recolha de ideias; uma terceira parte dedicada ao seu regresso à Europa, onde a autora aborda a sua passagem por Berlim, Paris e Londres, definindo este período como sendo um período de triagem de ideias; uma quarta parta em que se espalham as ideias de Humboldt pelo mundo e que envolve não só o seu regresso a Berlim, como também a sua viagem à Rússia e, depois, a redacção da sua obra mais importante, "Cosmos"; e uma quinta parte dedicada à evolução das ideias do geógrafo alemão, depois seguidas e desenvolvidas por outras áreas como a ecologia, a preservação da natureza, a evolução, a política e a própria imaginação/literatura, sendo que estas últimas foram abordadas noutras partes. Charles Darwin (1809-1882), Ernest Haeckel (1834-1919) e J.W. Goethe (1749-1832) foram algumas das figuras cujo pensamento acabou por, em certa medida, ser influenciado (e no caso de Goethe importa referir que este influenciou igualmente Humboldt) pelo geógrafo alemão. 

A leitura flui naturalmente, plena de pormenor, sem saturar e permitindo ao leitor explorar o meio, viajar com o geógrafo. Wulf apresenta e aborda a vida e obra de Humboldt com todo o detalhe, estabelecendo relações contrastantes entre este e o contexto sócio-político e económico da época. Humboldt parece (e foi) um homem à frente do seu tempo. Muitos dos seus conhecimentos são ainda hoje utilizados, sendo disso exemplo: a percepção da natureza como um todo, a distribuição da vegetação e do clima por zonas, a relação entre a actividade humana e a natureza... E Wulf destaca várias vezes isso mesmo, glorificando a vida e obra do geógrafo alemão que dedicou a sua vida a inventar a natureza... Num livro fascinante!

https://www.goodreads.com/review/show/1618680098

terça-feira, 26 de abril de 2016

Werther, de J.W.Goethe


"Werther" de J.W.Goethe
Abril Controljornal/Biblioteca Visão, 2000
126 Páginas

Publicada pela primeira vez em 1774 e podendo ser assumida como uma obra autobiográfica, "Werther" (ou melhor "Os sofrimentos do jovem Werther", já que é isso mesmo que significa o título original da obra em língua alemã quando traduzido à letra, " Die Leiden des jungen Werther") conta a paixão de Werther por Carlota, impossível de concretizar, na medida em que esta se encontra prometida a outro homem. 

Constituida por duas partes, a obra de J. W. Goethe inspirou-se no amor impossível que teve por Charlotte Buff (1753-1828), que se viria a casar com um diplomata e coleccionador de arte, Johann Christian Kestner, tendo feito algumas alterações aos nomes dos lugares e das pessoas, bem como ao próprio desfecho. 

Efectivamente, e através de uma escrita veemente (sem ser complexa e dificil de compreender), o leitor pode acompanhar o nascimento, crescimento e "termo" deste sentimento (e do sofrimento daí decorrente) de Werther, que o mesmo vai dando a conhecer através das cartas que redige com frequência ao seu amigo, Guilherme. 

Tendo sido bem acolhida na época em que surgiu, o livro "Werther" e a história real na qual se baseia acabariam por dar origem, em 2010, ao filme "Goethe!", dirigido por Philipp Stölzl (o trailer oficial, legendado em inglês, poderá ser encontrado aqui: https://www.youtube.com/watch?v=IqLvK... ). 

Ainda quanto ao livro, cumpre referir que o facto de ser uma obra com poucas páginas não reduz o mérito de Goethe. Pelo contrário. Goethe escreve muito em poucas palavras. Não é dificil colocarmo-nos na posição de Werther (ou Goethe) e, ao mesmo tempo, regressar à posição de observador de toda a "cena". O livro está também pleno de passagens intensas (ou melhor, profundas, porque parecem escritas com toda a alma) e, em alguns momentos, faz-nos pensar em "Romeu e Julieta" de William Shakespeare, sobretudo porque, embora com motivações diferentes, o que aqui está em causa é um amor impossível, platónico, que conduzirá também a um fim trágico. Recomendo, portanto, a sua leitura e voltarei, sem dúvida, a ler Goethe!
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"Como a sua imagem me persegue! Acordado ou a sonhar é sempre ela que enche a minha alma! Aqui, quando fecho os olhos, aqui, no meu cérebro, aonde converge a força visual, tenho eu gravados os seus olhos negros! Aqui! Não posso exprimir-to... Basta que feche os olhos para ver os dela, sempre como um oceano, como um abismo; estão à minha frente, estão dentro de mim, enchem todo o meu cérebro, todos os meus sentidos." (Goethe, 2000, pp. 97 e 98).

https://www.goodreads.com/review/show/1618653365?book_show_action=false

sábado, 23 de abril de 2016

Berlim Alexanderplatz, de Alfred Döblin


"Berlim Alexanderplatz" de Alfred Döblin
Edições Dom Quixote, 2010
591 Páginas


Publicado em 1929, "Berlim Alexanderplatz" de Alfred Döblin não é um livro de fácil leitura. Alfred Döblin escreveu um livro interessante, mas, por vezes, caótico. A sensação transmitida é muito semelhante àquela que Edvard Munch, pintor norueguês, provoca com o quadro "Skrik" [O grito]: angústia. Tanto o livro como o quadro inserem-no no Expressionismo, movimento artistico e cultural surgido no início do século XX na Alemanha. Este movimento deformava com frequência a realidade com o intuito de evidenciar os sentimentos (subjectivos) do ser humano.

Aqui a cidade de Berlim está nitidamente em convulsão, verificando-se a demolição de prédios, a realização de obras para a construção do metropolitano, vários cafés e tascas, muito pequeno crime e prostituição quase por toda a parte. Nota-se nesta Alemanha dos anos vinte, saída da Guerra, com uma República de Weimar instável e muitas reparações para pagar, uma certa loucura, caracteristica de um período de transformação da sociedade e dos seus valores. Quer-se experimentar tudo ao máximo, até ao limite e, nesse sentido, estamos diante de uma certa alienação, de um certo descontrolo. 


É nesta atmosfera que surge Franz Biberkopf, que, após ter saído da prisão, se sente como que desprotegido e cheio de medos ao confrontar-se com a pobreza, o crime e os primeiros passos do Nacional-Socialismo. Quer levar uma vida honesta, resistente ao ambiente que o rodeia e não consegue... Até certo ponto. 


Apesar da obra estar dividida em nove livros (que podemos entender como sendo capítulos) e do livro ter cerca de quatro páginas de sumário do que se passa em linha gerais em cada um dos livros, destinados a guiar o leitor, são vários os momentos em que, à semelhança de Berlim e de Biberkopf, nos sentemos perdidos. De um momento para o outro Döblin apresenta-nos um diálogo entre uma ou duas personagens que aparecem sem mais nem menos, numa tasca ou num café, e Biberkopf quase que fica invisivel. Depois, surgem as reflexões de Biberkopf e Döblin passa novamente de repente para o que acontece na cidade e com a Alemanha. Döblin traz novamente à cena Biberkopf com mulheres (quem são as prostitutas, quem são as namoradas) e depois com judeus e depois com bândidos e o leitor vê-se novamente confuso, como que angustiado, tentando procurar o norte da história...


Ainda assim, considero-o um livro interessante, sobretudo pelo esforço do autor tentar demonstrar como se encontrava a Alemanha saída da Primeira Guerra Mundial e nas vésperas da chegada do Nacional-Socialismo ao poder e, consequentemente, procurar articular isso com a vida de Biberkopf e tentar demonstrar em que medida o homem e a sua obra é influenciado pelo meio e deste pode facilmente tornar-se um produto... Se se deixar levar pela apatia e pelo medo!


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P.S: Há igualmente um filme do livro, de 1931, que poderá ser visto aqui:https://www.youtube.com/watch?v=m26zs... (Falado em alemão e sem legendas).

https://www.goodreads.com/review/show/1598001700?book_show_action=false

segunda-feira, 18 de abril de 2016

O Diário de Mary Berg, de Mary Berg


"O Diário de Mary Berg" de Mary Berg
Vogais, 2015
351 Páginas

Já li vários livros sobre o Holocausto. Já li vários diários escritos por quem viveu o Holocausto, mas nenhum é igual ao outro. Há sempre algo de novo nos livros e este não é excepção! 

Para começar, o país a que pertencem (isto é, onde nasceram e cresceram), as condições sócio-económicas da própria família, a educação e a faixa etária de quem escreve acabam por influenciar e distinguir os diários uns dos outros. De igual modo, o facto de se tratar de um homem ou de uma mulher acabará também por condicionar o seu futuro como judeus. 

No que respeita a "O Diário de Mary Berg", a sua autora começa a escrever com quinze anos, a 10 de Outubro de 1939, já iniciadas as primeiras perseguições efectivas aos judeus, verificando-se igualmente a presença alemã na Polónia e começada a Segunda Guerra Mundial. A autora escreve a última entrada do seu diário a 5 de Março de 1944, a caminho dos EUA (a mãe era de nacionalidade americana), com cerca de 19 anos. 

Ao conseguir salvar-se, muitos são os conhecidos, os amigos e os familiares que deixa, sem outro remédio, para trás. Mary escreve para que o mundo saiba, para que o mundo conheça o que aconteceu às inúmeras vidas que pereceram por uma questão de credo e raça, deixando-nos, com frequência, descrições detalhadas e minuciosas do que se passava nas ruas do gueto... Por vezes, do nada, mas, outras vezes, vindo ao encontro do clima de medo que se vivia..!

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"(...) diz a todos os que ainda vivem que nunca os esquecerei. Farei tudo o que puder para salvar os que ainda podem ser salvos e para vingar os que foram tão amargamente humilhados nos seus últimos momentos. E os que foram reduzidos a cinza, vê-los-ei sempre vivos. (...) Sê paciente, Rutka, tem coragem, aguenta. Mais um pouco de paciência e todos nós seremos livres!" (Berg, 2015, pp.326 e 327).

https://www.goodreads.com/review/show/1598005183

terça-feira, 12 de abril de 2016

Choque Cultural, de João Lopes Marques



"Choque Cultural" de João Lopes Marques
Marcador, 2012
271 Páginas 



"Choque Cultural" corresponde a um livro de crónicas de viagem dividido entre países pertencentes à Europa, Ásia, Américas, África e Oceânia. Com um estilo divertido, sem ser excessivo, João Lopes Marques leva-nos a viajar pelo mundo à descoberta de costumes e caracteristicas tipicas dos vários povos com quem se vai cruzando. 

Foi uma leitura descontraida, agradável e interessante, que me permitiu aprender várias particularidades dos países e suas culturas, questionar-me se algumas seriam mesmo assim e ainda compreender o porquê e o como de coisas provenientes dos outros países que nós já usamos como se fossem nossas. Convém igualmente não esquecer a presença portuguesa passada e actual praticamente nos quatro cantos do mundo, que o autor também faz a questão de notar ao longo de toda a obra. 

Recomendo!

https://www.goodreads.com/review/show/1598001306?book_show_action=false

sexta-feira, 1 de abril de 2016

Um Guia para a Vida, de Dalai Lama e Howard Cutler

"Um Guia para a Vida" de Dalai Lama e Howard Cutler
Editorial Presença, 2014
302 Páginas

"Um Guia para a Vida" lê-se com tempo, mas sobretudo com calma. Para interiorizar os ensinamentos tanto de Dalai Lama, líder espiritual do povo tibetano, como de Howard C. Cutler, psicólogo americano. Embora partindo de pontos extremos do globo, o ocidente e o oriente, a verdade é que as suas ideias encontram-se sempre no caminho em direcção à felicidade, que todos nós queremos e pretendemos alcançar nas nossas vidas. 

Com efeito, o livro encontra-se dividido em cinco partes: uma primeira parte dedicada ao sentido da vida, uma segunda parte correspondente a uma nova concepção de intimidade, uma terceira parte relativa à transformação do sofrimento, uma quarta parte atinente à vitória sobre os obstáculos e, finalmente, uma quinta parte concernente a reflexões finais sobre a vida espiritual. 

Enquanto Dalai Lama apresenta os ensinamentos budistas respeitantes a cada uma destas partes, Cutler, o psicólogo, confronta-os com os resultados da ciência e com a sua experiência em consultório e o resultado é uma obra de grande interesse, na medida em que "Um Guia Para a Vida" nos faz pensar e repensar aspectos essenciais da nossa existência, ao mesmo tempo que nos leva a questionar o nosso comportamento e, em alguns casos, ser tentados a transformá-lo por algo melhor, mais positivo e, portanto, mais saudável física e psicologicamente. Na verdade, o Budismo parece ser acima de tudo uma filosofia, um estilo de vida, com o qual se pode aprender algo de novo, lógico e racional. Em duas palavras: grande leitura!


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"a felicidade depende mais do nosso estado de espírito do que das circunstâncias exteriores."[Dalai Lama & Howard Cuttler, 2014, p.49]

https://www.goodreads.com/review/show?id=1590306568

A Minha Viagem pela Europa, de Charlie Chaplin



"A Minha Viagem pela Europa" de Charlie Chaplin
Edições Matéria-Prima, 2011
251 Páginas

"A minha viagem pela Europa" refere-se, como o próprio título indica, à viagem realizada por Charlie Chaplin, em 1922, com o intuito de vir passar férias à Europa e visitar Londres, após sete anos de intenso trabalho em Hollywood. 

Procurando passar despercebido e no anonimato, coisa que só poucas vezes consegue atingir com sucesso, Chaplin conta-nos o que vê, faz, com quem se encontra e que sente quando regressa à cidade de Londres e ao local onde nasceu, fazendo o mesmo relativamente à sua passagem por Paris e Berlim. Nestas três cidades o autor consegue sempre identificar a presença das consequências da Primeira Guerra Mundial, quatro anos depois desta ter terminado e revela-se extremamente observador da realidade, sobretudo no caso da Alemanha, onde sublinha algo, também já destacado por Aquilino Ribeiro na "Alemanha Ensanguentada", como seja a miséria (os pedintes), os soldados sem perna e de uniforme gasto do tempo e do uso, e a amargura/irritação quando o assunto é o desfecho da Guerra para a Alemanha. 

Por outro lado, e para além destas referências às cidades no pós Guerra, Chaplin oferece-nos um interessante relato sobre o modo como gosta de sentir o seu trabalho reconhecido e ser acarinhado pelo público que o acompanha em multidões para todo o lado. E ele dá sempre o melhor de si, o seu sorriso mais genuíno na hora de lhe deixar tirar mais uma fotografia. Isto para não falar na forma genuína e sensível com que demonstra compaixão por aqueles que vivem em condições mais desfavorecidas, procurando, sempre que possível, ajudá-los de alguma forma.

Enfim, "A minha viagem pela Europa" revela-nos o lado humano escondido atrás do "boneco" engraçado de bengala, chapéu e sapatos grandes, que muitas gargalhadas e momentos de descontração conseguiu arrancar a todos os fãs do admirável mundo do cinema e, não é recomendável, mas sim altamente recomendável!
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"Olho para a lua e para as estrelas e diz-me quão estúpida é a festa, qualquer festa, comparada com a beleza da noite. O silêncio é um dom universal e do qual poucos de nós desfrutam. Talvez porque não possa ser comprado. Os homens ricos compram ruído. As almas deliciam-se com os silêncio da natureza." [Chaplin, 2011, pp.38 e 39]

https://www.goodreads.com/review/show?id=1590301461