segunda-feira, 18 de julho de 2016

Alentejo Prometido, de Henrique Raposo

"Alentejo Prometido" de Henrique Raposo
Fundação Francisco Manuel dos Santos, 2015
107 Páginas
"Alentejo Prometido" de Henrique Raposo lê-se rápido, sem demoras. Não é um livro maçador, mas também não é um tratado sobre o Alentejo. É acima de tudo a perspectiva do autor (a partir da experiência da sua família materna e paterna) que figura neste seu retrato desta zona do país. Por vezes, com um estilo mais mordaz, é verdade, mas parece-me que sem malícia. E esse seu estilo característico chega mesmo a conferir uma certa vivacidade à leitura em certos momentos... (Pese embora haja alturas em que esse estilo possa ser em demasia para aqueles que estão a ler um trabalho seu pela primeira vez e não o conhecem de todo.)

Por outro lado, não é só sobre a sua experiência com as suas raízes do Alentejo que o autor escreve, Raposo procura encontrar reflexos em dados estatísticos, que corroboram algumas das suas percepções, bem como em outros autores que anteriormente escreveram sobre o Alentejo de forma ficcionada ou não. 

Há várias ideias que aqui são abordadas e que eu já tinha ouvido ou lido em algum lado. O suicidio tantas vezes aí verificado é uma delas, mas discordo do autor quando de alguma forma parece "condenar" quem se suicida. Não sou apologista do suicidio (não resolve nada e quem o comete já primeiramente a prejudicar-se a si próprio) nem sou crítica. Respeito. O suicidio é uma fuga. Uma fuga de alguém que não aguenta mais a pressão de determinada situação e cuja necessidade de ajuda/apoio passou ao lado de quem estava por perto (desantento) ou podia aproximar-se. É acima de tudo um acto de desesperado desespero. Penso que não deve ser condenado nem vangloriado. Deve, isso sim, ser evitado e será se todos passarmos a estar mais atentos a quem nos rodeia... E menos concentrados em nós mesmos. 

Depois, há a aridez que se sente mais marcadamente no Verão, por exemplo, o tal cheiro a queimado sem que haja incêndio algum... A menor quantidade de água se comparado com a zona Norte do país. Isto são aspectos que Raposo refere e que, embora não conhecendo na totalidade o Alentejo (conheço melhor o Norte do país, admito), senti e constatei quando lá fui (e não conheço ainda o Litoral) nos sitios em que estive. De todas as vezes. Porém, isso não lhe tira a beleza, nem o interesse. Torna-o diferente, único. Merecedor de uma ou mais visitas. 

"Alentejo prometido" pode resumir-se a isto: o olhar de Henrique Raposo sobre o Alentejo. Não é uma verdade absoluta (que não existe), é apenas a sua perspectiva. E penso que é com isto em mente que a obra deve ser lida.

*
"Eram duas da tarde, e a esta hora o Alentejo não cheira nem soa a nada. O calor abafa tudo. Só sentimos o pó, na garganta já devidamente terrincado, e no rosto onde se junta o suor para formar uma película pastosa que nos envolve como uma segunda pele.(...) 
À tardinha o Alentejo já tem cheiro, a resina das estevas, o mel das figueiras, o odor a haxixe dos eucaliptos, o cheiro da própria terra que tem sempro um leve travo a incêndio apesar de não haver incêndios. (...)" (Raposo, 2015, pp. 17, 33 e 34)
 

https://www.goodreads.com/review/show/1680074044

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